30.7.05

Interlúdio

Este blogger não é suficientemente hi-tec para conseguir continuar a postar durante o período de férias.

Mas não saia do seu lugar, porque daqui a semanas há mais.

A educação pelo videojogo

Se o Valentim Loureiro distribui electrodomésticos, porque é que o Governo não há-de dar computadores, ou seja lá o que for que a loja aceitar escrever na factura? Afinal, todos os miúdos devem ter acesso aos jogos de video, não é verdade?

29.7.05

Humilde petição

"Respeito muito os signatários, mas há sociedades que valorizam mais a especulação e a análise, enquanto outras valorizam mais a busca de soluções." (Manuel Pinho, Diário Económico, 28-07-07)

Esta frase do Ministro da Economia, que encontrei no Abrupto, é absolutamente lamentável. Retoma a velha ladainha dos "práticos" que abominam a inteligência e o livre exame.

Queira o Senhor Ministro ter a bondade de nos informar o que é que, a partir de agora, estamos autorizados a discutir sem incorrermos no pecado de obstaculizar o desenvolvimento do país.


Misteriosamente, só uma vez em cada milénio surge à face do planeta um grande compositor do sexo feminino. (Compositora não me soa bem.) O nome desta que calhou ser nossa contemporânea é Sofia Gubaidulina e o acesso livre e total à sua música foi mais uma das felizes consequências do desmoronamento da União Soviética.

Escutem aqui um trecho de O Cântico do Sol.

Conservadorismo estival

Identifico-me inteiramente com esta variante do conservadorismo.




Alberto Burri: Cretto bianco.

Podemos esperar sentados

Há muitos estudos técnicos parcelares relativos à OTA e ao TGV, mas, julgo eu, não existe nenhum estudo sintético de avaliação custo-benefício, seja num caso seja no outro.

Logo, não percam tempo a exigir que eles sejam colocados online, exijam antes que sejam realizados.

Eis uma situação em que, a avaliar pelo que se lê nos blogues das mais variadas tendências, parece existir uma clara e quase unânime convergência nacional.

É uma exigência simples e em que vale a pena fazermos finca-pé: nem um euro gasto enquanto não for feita uma avaliação rigorosa deste (e doutros) projectos.

Missa de 7º dia

Em política, o que parece é.

Se Campos e Cunha falou verdade ao invocar cansaço, somos forçados a constatar que neste país é possível os lugares de maior responsabilidade serem entregues a pessoas sem a menor capacidade de resistência à adversidade. Onde é que Sócrates tinha a cabeça quando o nomeou? O que é que de facto sabia sobre as suas capacidades e limitações?

Inversamente, se a razão invocada para sair não passou de uma desculpa de ocasião, qual a sua justificação para não ter explicado claramente ao país que, no seu entender, o governo está a seguir uma via perigosa para o equilíbrio das finanças públicas?

Em qualquer das alternativas, o ex-ministro revelou não estar à altura do cargo que fugazmente ocupou.

Paz à sua alma.


Alberto Burri: Combustione.

Inovação ontológica

De há uns tempos a esta parte, surgiu no nosso pobre país uma nova entidade que dá pelo nome de "os economistas".

Decididamente, só conseguimos funcionar em rebanho.

Maria do Carmo à caixa 9

Mais um blogue como deve de ser. Experimentem começar por aqui.

28.7.05

Perguntas pertinentes

A propósito desta pergunta, eis uma outra, porventura ainda mais importante: a quem pertencem os terrenos onde se encontra actualmente situado aeroporto da Portela?

Eu sei a quem não pertencem...






Lucio Fontana.

27.7.05

Falar por falar

O que é que isto quer dizer? Nada, evidentemente.


26.7.05

Quem começou?

Dizem, com razão, que o terrorismo não começou com a invasão do Iraque.

E eu recordo que a paranóia também não começou com o 11 de Setembro. Lembram-se do bug do ano 2000?

Clareza moral

Onde ela de facto faz falta.




Lucio Fontana: Conceito espacial, 1959.

A idade e o mundo

Mil vezes pior que a idade de Soares é a falta de mundo de Cavaco. É que, bem vistas as coisas, tirando Finanças Públicas, de que é que ele percebe? Pior: tirando isso, que interesses tem ele na vida?

Mas, enfim, isso parece não assustar ninguém....

A conspiração grisalha

Aumentam a idade da reforma, e depois admiram-se que apareça um candidato a Presidente da República com 80 anos!

A minha previsão é que, para a próxima vez, haverá muitos mais.

Agitação no Paraíso

Uma velha piada ensinava-nos que, no Paraíso, a polícia é britânica.

Desde a semana passada deixou de o ser, e o pior é que ainda não se sabe quando será possível arranjar substituta à altura.

25.7.05



Alberto Burri: Bianca plastica B3, 1965.

Tentem outro slogan

Alguém imagina que Cavaco Silva possa vir a ser um PR não-interventivo?

E pode alguém que o imagine nessa postura sentir-se motivado para nele votar? Aposto que não, a começar, por razões óbvias, pelo próprio Pacheco Pereira.

Repito o que já disse noutras ocasiões: no dia em que finalmente Portugal tiver um PR de direita, a esquerda tó-tó descobrirá finalmente que, afinal, a Constituição é perfeitamente compatível com o presidencialismo.

Sonos agitados

OK.

Se, e quando, o Mário Soares for Presidente, a gente depois confere.


Alberto Burri: Saco S3, 1953.

Sprint ao ralenti

Até à semana passada, as eleições presidenciais assemelharam-se àquelas provas ciclistas de velocidade em pista, em que, até umas escassas dezenas de metros da meta, os concorrentes se esforçam sobretudo por ficar atrás, chegando praticamente a imobilizar a bicicleta com inacreditáveis números de equilibrismo.

Eles sabem que aquele que arrancar primeiro parte em desvantagem, visto que os outros, seguindo na sua roda, poderão reservar energias para o ataque final quase em cima da linha de chegada.

Agora, de repente, tudo começou a mexer. Freitas ofereceu-se para o que for preciso. Alegre dispôs-se a concorrer. Soares pôs o dedo no ar, apesar de ninguém lhe ter perguntado nada. Sócrates não perdeu tempo, e declarou publicamente a sua preferência por Soares, sendo provável que Alegre lhe ceda a primazia e que Freitas recue.

Cavaco hesita em chegar-se à frente. Vai para férias conferenciar com a família. Quando chegar a uma conclusão, poderá ser tarde para acompanhar o ritmo de Soares.

Se o seu propósito era jogar pela certa, já perdeu. De maneira que ainda poderá ser substituído à última hora pelo falhado de maior sucesso da política portuguesa contemporânea - Marcello ele próprio.

24.7.05

«The thousand million that have never spoken yet»



Free World, de Timothy Garton Ash, um especialista de história contemporânea, propõe-nos uma visão ampla, crítica e lúcida do mundo em que hoje vivemos.

Ash propõe duas teses principais. A primeira, sustenta que, apesar dos perigos que enfrentamos, temos hoje pela frente uma oportunidade singular para expandirmos a liberdade, a democracia e o bem-estar em todo o planeta. A segunda, afirma que, para isso ser possível, é indispensável uma aliança entre a América e a Europa.

Ash, um incorrigível optimista, acredita que uma combinação justa de realismo e idealismo permitir-nos-á superar as presentes dificuldades e construir um mundo melhor.

Pessoalmente, considero que a América exerce um efeito positivo sobre a Europa e vice-versa. Por esse motivo, vejo com apreensão a tendência para seguirem caminhos opostos, algo que só pode contribuir para enfraquecer aquilo a que Ash chama o mundo livre.

O problema é que, nas últimas eleições presidenciais americanas, pode ter sido dado um passo irreversível no sentido do aprofundamento das divergências entre os dois pilares da aliança atlântica.

Resta-nos não apenas esperar, mas trabalhar para que Garton Ash tenha razão.

(Existe um website onde os leitores podem debater entre si os principais temas do livro: freeworldweb.net)


Makoto Aida.

Moral e terrorismo

A propósito de uma alegada necessidade de claridade moral para combater com sucesso o terrorismo, José Manuel Fernandes critica hoje Mário Soares por ele ter colocado a par o bombardeamento de Londres pela Alemanha nazi e o de Dresden pelos aliados.

Recorrendo ao estilo de argumentação a que o professor Espada nos habituou, Fernandes despacha o assunto explicando que «um recente livro» (que nem sequer se dá ao trabalho de nomear) prova que, ao contrário dos bombardeamentos de Hitler, os dos aliados «cumpriam um desígnio militar». Ora eu conheço alguns livros que demonstram que o bombardeamento de Dresden foi uma barbaridade para a qual é difícil encontrar paralelo na história militar.

A questão central, porém, não é essa. Para nos unirmos na luta contra o terrorismo apenas precisamos de uma plataforma sensata - como, por exemplo, aquela que é proposta no muito citado mas pouco lido Relatório da Comissão do 11 de Setembro - e não de uma cruzada moralista de contornos preocupantes, ainda por cima quando essa moral se revela afinal altamente tolerante das imoralidades dos nossos amigos, entre as quais se contam as mentiras que justificaram a invasão do Iraque, os bombardeamentos indiscrminados que vitimaram largas dezenas de milhar de civis inocentes, as torturas na prisão de Abu-Graib ou as prisões à margem de qualquer legislação nacional ou internacional em Guantanamo.

Cada vez estou mais persuadido de que essa ofensiva moralista é parte do problema, e não parte da solução.

Obras «de prestígio»

Vasco «Pulido Valente» presta um enorme serviço ao país listando, a propósito da OTA e do TGV, uma infinidade de «obras dementes» e «de prestígio» em que o país tem esbanjado «rios de dinheiro».

A lista está, porém incompleta, visto que só por descuido se pode entender que Vasco possa ter deixado de lado o museu de Serralves, a gare do Oriente, a nova Biblioteca Nacional, a primeira e a segunda pontes sobre o Tejo, as pontes da Arrábida e do Freixo no Porto, a ampliação do aeroporto do Funchal, a rede nacional de auto-estradas, a navegabilidade do Douro, a criação da RTP, a electrificação da linha férrea, os aeroportos da Portela e de Cabo Ruivo, a ponte de Vila Franca de Xira, o serviço de cacilheiros, as Pousadas de Portugal, a estação do Rossio e o respectivo túnel, o teatro D. Maria, a Casa Pia, o aqueduto das Águas Livres, o teatro de S. Carlos, a Torre de Belém, ou mesmo a própria plantação do pinhal de Leiria. Entre outras.

A olhar para o céu

Apesar de ter criticado aqui a oportunidade e a prioridade dos investimentos no aeroporto da OTA e na rede do TGV, eu não tenho uma opinião definitiva a favor ou contra esses projectos em si mesmos.

Ou, por outra, não tinha. Até que, na 6ª feira, Miguel Sousa Tavares me abriu os olhos, demonstrando que, para pontificar sobre o assunto, bastam «simples senso comum» e «olhar para o céu», e alinhavando, em seguida, um chorrilho de asneiras sobre aquilo que, com a usual ferocidade, chama «o crime da OTA».

Lamento, porém, informá-lo de que esse método não é original. Bem pelo contrário, a esmagadora maioria da opinião publicada em Portugal, verse ela sobre aeroportos, incêndios ou política orçamental, é construída sobre senso comum incompetente e meditações aéreas.

O alarido que recentemente se ergueu em torno da OTA e do TGV revela o país no seu pior. Parece que à tradicional histeria pró obras públicas sucedeu agora uma nova histeria anti obras públicas. Será mesmo impossível discutir estes temas racionalmente? É o que parece.

Entretanto, eu faço notar que, se se decidisse não construir o aeroporto da OTA, isso não eliminaria a necessidade de se investir nos próximos anos muito dinheiro em infra-estruturas aeroportuárias. E que, se se pusésse de parte o TGV, não deixaria de ser preciso investir largas somas em infraestruturas ferroviárias.

Mas, evidentemente, nós não estamos à espera que os Sousas Tavares deste país entendam isso.

Media e pseudo-ciência

Atenção a este certeiro comentário de Rui Pena Pires, no Canhoto sobre um muito badalado «estudo» sobre o ensino da Matemática em Portugal. Ao que parece, os investigadores também não sabem matemática...


22.7.05



Makoto Aida, Chiho Aishima.

É preciso acabar com os blogues

Abençoada a pátria que tais juristas dá ao mundo.

Pedintes

Pois é, caro Lutz. Os pedintes portugueses mais qualificados frequentam as secretarias de Estado. Só os incompetentes têm que ir para o Metro.


Descobertas

Dois novos blogues, altamente recomendáveis: O Pornographo e Na Morte de Solvstag.

20.7.05

Falar verdade

É chegada a hora, julgo eu, de questionarmos sem tibiezas todos os preconceitos politicamente correctos, a começar pelo famoso «direito» às férias.

O país não suporta tamanho desperdício, evidente quando se pensa que esse sacrossanto direito reduz todos os anos o PIB em mais de 9%. Além disso, esse tempo de não-trabalho é, em resultado do subsídio de férias, vergonhosamente pago a dobrar!

Depois, há o problema do fim de semana. Deus decretou o descanso dominical, os sindicalistas, que já nasceram cansados acrescentaram-lhe o repouso ao sábado. Resultado: mais uma quebra de 21% no PIB.

Daqui resulta, por um simples cálculo ao alcance dos nossos politicos, que a eliminação das férias anuais e do descanso ao sábado permitiria imediatamente ao país ultrapassar a Espanha em nível de desenvolvimento.

Há que ter a coragem de revogar sem mais demoras todas estas invenções comunistas, sob pena de a competitividade do país continuar diariamente a degradar-se.

19.7.05



Murakami: Dupla hélice invertida, Nova Iorque.

Direita e esquerda

Quando se estuda inferência estatística ensinam-nos que é possível cometer-se dois tipos de erros.

O erro de Tipo 1 consiste em recusar-se uma hipótese que na realidade é verdadeira. O erro de Tipo 2, em aceitar-se uma hipótese que de facto é falsa.

O drama é que só é possível diminuir-se a probabilidade de se cometer um erro de Tipo 1 aumentando a probabilidade de se cometer um erro de Tipo 2, e vice-versa.

Algo de semelhante ocorre quando se discute se deve ser adoptada uma determinada política de alcance social, tal como, por exemplo, a introdução do rendimento mínimo garantido.

Há um risco de que o rendimento seja negado a alguém que de facto necessita dele (erro de Tipo 1), tal como há um risco de que seja concedido a alguém que não deveria recebê-lo (erro de Tipo 2).

As pessoas que se situam mais à esquerda preocupam-se relativamente mais com a probabilidade de ocorrer um erro de Tipo 1, ao passo que as que se situam mais à direita temem principamente um erro de Tipo 2.

Naturalmente, há também, de um e de outro lado, os extremistas: à esquerda, os que acham que o rendimento deve ser atribuído sem restrições ou limitações, porque não admitem sequer a eventualidade de um erro de Tipo 2; à direita, os que se opoem terminantemente à própria existência do rendimento, porque não consideram a possibilidade de realmente ocorrer um erro de Tipo 1.

Guerra às sombras

Heródoto conta algures a estória de um povo do Norte de África cuja cidade foi assolada por uma violenta tempestade de areia que causou inimagináveis estragos nas culturas e vitimou um elevado número de homens e animais.

Reunidos em conselho, uma unânime indignação impeliu-os a declarar guerra ao deserto. E assim equiparam um grandioso exército que, no dia aprazado, caminhou destemidamente rumo ao Sul por sobre as areias escaldantes. Nenhum dos valorosos soldados que partiram voltou a ser visto.

Não sei porquê, lembro-me sempre deste conto quando ouço falar da guerra contra o terrorismo.

18.7.05



Jason Moran: Jump Up (do CD «Some Mother»).

À beira de Moran, Brad Mehldau é um tenrinho.

Chantagem ideológica

No seu artigo da passada semana no Público, Pacheco Pereira escrevia:

«Acima de tudo, não compreendo porque razão um terrorismo apocalíptico, que tenta por todos os meios ter as armas mais pesadas, nucleares, químicas e bacteriológicas, para garantir o seu Armagedão sacrificial, que tem como objectivo a guerra total, ou seja a aniquilação de milhões dos seus adversários, haja os meios para isso, não tem que ser combatido com tudo o que tenho á mão: tropas, polícias, agentes de informações, à dentada diria um velho inglês da Home Guard, daqueles que esperava a invasão da sua ilha e achava que sempre podia levar um «boche» consigo. E aí o «não se limpam armas», é de um simplicidade brutal. Ou nós ou eles.»

Este tema é extremamente delicado. Merecia, por isso, uma discussão mais demorada e, sobretudo, mais cuidada, para a quel de momento me falta tempo.

Não posso, no entanto, deixar de perguntar: que terrorismo apocalíptico é esse de que PP aqui fala. Onde está ele afinal? Onde as armas «nucleares, químicas ou bactereológicas»? Onde a «guerra total»? Onde a «aniquilação de milhões»? Onde, que não os vejo?

Escapa-me totalmente a relação entre esta linguagem hiperbólica e os factos.

Existe mesmo esse terrorismo apocalíptico, ou será antes um mero produto de certas imaginações fertéis que, a coberto dessa fantasia, pretendem impor-nos uma agenda política e militar irracional e agressiva, estribada no medo e no ódio?

É que, bem vistas as coisas, nada semelhante a isso aconteceu ou, que se saiba, esteve, até hoje, para acontecer .

Nem eu nem ninguém prudente pode garantir que não irá acontecer um dia. Tudo o que posso dizer é que não se me afigura muito provável, tal como não se me afigura muito provável que amanhã me caia na cabeça um meteorito vindo do espaço, embora essas coisa aconteçam.

Por isso, ou estas pessoas explicam claramente de que elementos dispõem para poderem usar sem exagero esta linguagem alarmista, ou teremos que concluir que apenas pretendem colocar-nos sobre chantagem e impedir qualquer debate racional sobre os males do mundo.

«Imbecilidade à mão armada»

Todas as noites, a estupidez «marca presença» nos telejornais, e a ignorância «é uma constante».

Para um breve mas certeiro tratado do analfabetismo televisivo, leiam este post do Cristóvão de Aguiar.

(O título acima foi retirado de um comentário ao post aqui mencionado.)

16.7.05

Retrato robô do terrorista

Tipo sossegado. Trato afável. Temente a Deus. Ambiente familiar equilibrado. Muito caseiro. Funcionário diligente. Bom pai de família. Amigo das crianças. Não joga nem bebe. Não é mulherengo. Joga cricket.

Entenderam? Agora, é só localizá-lo e prendê-lo antes que possa fazer mal.


Murakami.

15.7.05

Um deus menor

Visitando o frescos, fico a saber que, hoje, a palavra do dia é «Deus».

Intrigado com esta súbita inclinação teológica da lusa blogoesfera, procuro saber a que propósito foi invocado o santo nome.

Não tarda um minuto, está tudo esclarecido: afinal, este Deus de que tanto se fala é o Moita, esse mesmo, o de O Acidental!

(Espero que o Rodrigo não se ofenda por lhe chamar «Deus menor». É só por comparação com o Outro, é claro!)


Murakami: Cogumelos.

Business bullshit

A discussão filosófica da moda gira em torno das origens, alcance e significado da conversa da treta (bullshit).

Durante muitos anos, os políticos foram o grande centro de difusão e promoção de conversa da treta, mas eis que agora os gestores se esforçam por roubar-lhes a primazia nessa área.

Leiam, a esse propósito, este delicioso artigo do John Kay, publicado no Financial Times da passada 3ª feira.

14.7.05



Bobby Previte: Madame Previte.


Anselm Kiefer: A mulher de Lot, 1989.

Ousem compreender

Têm toda a razão no que dizem, o Terras do Nunca e o Quase em Português.

O que Pacheco Pereira hoje faz no Público é a apologia da estupidez. Enfim, mais tarde ou mais cedo alguém haveria de se saír com este argumento, mas é pena que tenha sido ele...

É nestas alturas que se percebe que a exigência do Iluminismo - «ousa saber!», pedia Kant - continua a fazer todo o sentido.

Guerra de sombras

É estranho que os mesmos que acham fazer sentido falar-se de guerra contra o terrorismo (ou, pior ainda, de guerra contra o terror, ou seja, de guerra contra um sentimento) percam as estribeiras quando alguém lhes fala de negociação.

Ora negociar é uma arma que ninguém pode pôr liminarmente de lado quando trava uma guerra. A negociação pode vir ou não a revelar-se necessária, mas o que não faz sentido é alguém auto-limitar-se à partida jurando que jamais negociará. Bravatas e gabarolice não têm lugar na estratégia militar.

Há, todavia, um excelente argumento contra a negociação neste caso concreto. Consiste em fazer ver que só se pode negociar quando há algo para negociar, ou seja, quando ambas as partes querem algo e é possível imaginar-se um processo no final do qual ambas cedem qualquer coisa para obterem uma parte do que inicialmente reclamavam.

Ora, nesta luta contra o terrorismo, sabe-se o que nós queremos. Mas não se sabe o que quer a outra parte, porque ela, precisamente, não quer nada. Dito de outra maneira, ela quer o nada, ou seja, a aniquilação total de toda e qualquer pessoa, instituição ou ideia que se lhe oponha. É a isso que, algo pomposamente, se chama niilismo.

Não vejo como isso se pode negociar, pela mesmíssima razão que não vejo como se poderá travar uma guerra contra um isso tão vago e incaracterístico.

A guerra contra o terrorismo é algo tão irracional como o próprio terrorismo que se propõe combater.


Makoto Aida.

Caridade

«D. Duarte [filho do marquês de Marialva] (...) pendurou-se do peitoril da varanda e esteve suspenso alguns instantes (...). Os pobres, que não tinham nada que fazer enquanto não chegava Sua Majestade, pareciam deleitar-se muitíssimo com estes rasgos de agilidade.

«Deram eles logo comigo e, dois alentados matulões, que uma desgraçada combinação de bexigas com escrófulas tinha privado da vista, informados, sem dúvida pelos seus companheiros, de tudo o que se ia passando, começaram um curioso diálogo com vozes mais roucas e ásperas do que as dos sagrados corvos:

«- O céu dê prosperidade a suas nobres excelências, o senhor D. Duarte Manuel e o senhor D. Pedro, e a todos os Marialvas, e que possam os caríssimos meninos sempre gozar dos seus olhos e de todos os seus membros! Aquele que está na sua amável companhia é o caridoso inglês?

«- É, sim - respondeu o outro cego.

«- O quê? - replicou o primeiro. - É aquele generoso devoto do gloriosíssimo senhor Santo António?

«- Sim, é ele.

«- Oh, tivesse eu os meus preciosos olhos para poder contemplar o seu rosto! - exclamaram eles ao mesmo tempo.

«Foi crescendo assim o dueto com o tempo, e coxos, mancos e sarnentos, atando os ensebados barretes no extremo de compridas varas, meteram-nos pelas grades da varanda, clamando em altas vozes: - Esmola por amor do Santo de Lisboa!

«Nunca tive diante de mim a contemplar-me uma tão disforme e medonha colecção de fisionomias!

«Apressei-me a lançar-lhes uma mancheia de moedas de cobre, antes que D. Duarte sacudisse para fora os paus e os barretes - travessura que de forma alguma eu queria provocar, porque deitaria a perder a reputação que tínhamos, de atender pronta e polidamente os pedidos feitos em nome de Santo António.

«No momento em que os oradores estavam recebendo a sua porção de vinténs e de cinco reis, os gritos de - Aí vem a rainha! Aí vem a princesa! - levaram aquela hedionda multidão para outro ponto.»

William Beckford: Viagens a Portugal, 1787.


Makoto Aida: Grand plan... (detalhe 4).


Makoto Aida: Grand plan... (detalhe 3)


Makoto Aida. Grand plan... (detalhe 2)


Makoto Aida: Grand plan... (detalhe 1).

Criadagem e comezainas

«Havia hoje em volta da nossa mesa ao jantar maior número de servidores do que é costume, e as enormes e maciças iguarias eram trazidas por uma longa comitiva de cavalheiros e capelães, alguns condecorados com as ordens de Avis e de Cristo. Esta corte tinha um aspecto inteiramente feudal, e transportava a nossa imaginação às épocas da cavalaria, quando os grandes chefes eram servidos, como os reis, pelos seus nobres vassalos.

«Devem os portugueses ter estômagos de avestruz para digerirem a grande quantidade de saborosas viandas com que se empanturram. Os seus vegetais, o seu arroz, as suas aves, são todos estufados, cozidos na substância do presunto e tão fortemente temperados com pimenta e cravo, que uma colher de ervilhas ou a quarta parte de uma cebola são suficientes para nos deixar a boca a arder. Com uma tal dieta e o contínuo gulosar de doces não me surpreende que se queixem tantas vezes de dores de cabeça e de ataques de nervos.»

William Beckford: Viagens a Portugal, 1787.


Makato Aida: Grand plan to alter Shinjuku-Gyoen, 2001.

13.7.05

Modas

A avaliar pelo vestuário, o que hoje mais se valoriza nas mulheres é o golpe de rins.

E nos homens? - A inocência...


Makoto Aida: Air raid on New York City, 1996.

Novos ricos

«Vimos a nova casa, recentemente acabada com enorme dispêndio por João Ferreira, que, de humilde negociante de sola a retalho, se elevou, pelo valimento do arcebispo confessor [o grande inquisidor], à posse de um dos mais lucrativos contratos em Portugal. Nunca vi aposentos mais horrendamente dispostos do que os que o pobre homem dos couros delineou para si. As cortinas são de cetim azul ferrete e do mais vigoroso e enxofrado amarelo, e os estuques dos tectos foram ornados com pinturas alegóricas, mediocremente executadas, e cobertos de ornamentos dourados no estilo daquelas esplêndidas tabuletas que eram, há anos, a glória de High Holborn e de St. Gile’s.»

William Beckford: Viagens a Portugal. 1787.

Beatos

«Marialva tremia todo, tanta era a devoção, e o mesmo fazia o seu companheiro, cujos joelhos estão calejados do frequente ajoelhar, e que, se dermos crédito a Verdeil, acabará os seus dias num eremitério, ou doido, ou talvez ambas as coisas. Pretende ele também que este velho frade é que tem contribuído para aumentar o devoto zelo de Marialva, e que os dois, animando-se mutuamente, devem em breve produzir frutos dignos de Bedlam [hospício londrino para alienados], senão do Paraíso. O que é certo é que este religioso pode-se gabar de ter um aspecto conspicuamente beato, e uma forma vigorosíssima de bater nos peitos; porém isto não o deve desvanecer muito: há em Lisboa pelo menos cinquenta ou sessenta mil boas almas que, sem terem viajado tanto, castigam-se tão ruidosamente como ele. Esta manhã na [igreja da] Boa Morte, um velho pecador permaneceu durante toda a missa com os braços abertos, na posição e com a inflexível rigidez dos antigos candeeiros de braços, e outro contrito personagem comoveu-se tanto, no momento da consagração, que assentou o nariz no pavimento e lambeu a espessa camada de pó e lama de que ele estava coberto.»

William Beckford: Viagens a Portugal, 1787.


Anselm Kiefer: Mar Vermelho, 1984-5.

Uma comparação inadequada

Vital Moreira compara o entusiasmo que rodeou em Espanha a aprovação do "Plano de Infra-Estruturas e Transportes" com a vaga de críticas dirigidas entre nós contra os projectos do TGV e do aeroporto da Ota.

Mas parece-me que seria mais adequado perguntar onde está o "Plano de Infra-Estruturas e Transportes" nacional em que se enquadram a Ota e o TGV. Obviamente, não existe. Por conseguinte, não se sabe em bom rigor que propósito nacional anima esses dois projectos. É esse o problema.

12.7.05

No meu país nunca acontece nada

Se querem saber porquê, comecem por aqui.

Hilariante e deprimente.

Tempos difíceis

Se havia cafes modernos na Lisboa dos anos 60, eles eram sem dúvida o Vá-Vá e a Suprema.

Hoje à tarde aconteceu-me parar na Suprema para tomar uma bica, e encontrei o sítio infestado por um insuportável fedor a sardinha assada, que pelos vistos era o prato do dia.

Esperem mais um bocadinho e ainda vão ter oportunidade de saborear sandes de torresmos na Versalhes.

Gabarolice

«- Já viram alguma vez - dizia ele - tão admiráveis frutos? A nossa rainha tem milhares e milhares de léguas cobertas de pomares mais altos do que a vossa cabeça, e minas de ouro e diamantes debaixo dos vossos pés. A riqueza e a fertilidade das suas possessões não tem outros limites senão o mar, e o próprio mar será nosso, se nós quisermos: não nos faltam os materiais de construção, mastros de duzentos pés de altura, madeiras incorruptíveis e valentes marinheiros! D. Frederico pode contar-lhe as proezas que alguns dos nossos heróis praticaram, não há muito tempo, contra os gentios de Goa. Os seus John Bulls, em ardimento e valor, não chegam a metade dos nossos!

«E assim foi prosseguindo, bravateando e ensurdecendo-nos com os seus altos brados. Em patrióticas fanfarronadas e jactâncias nenhuma nação excede os portugueses, e nenhum português excede o abade!»

William Beckford: Viagens a Portugal, 1787.


Anselm Kiefer: Sete Torres, 2004-5.

As lições de Londres

O Diário da República reproduz este magnífico artigo de Timothy Garton Ash extraído do Público de 2ª feira sobre os ataques terroristas da passada semana.

Concordo com quase tudo o que lá se escreve. Quanto à parte com que não concordo, o mais natural é que seja eu que estou enganado.

Manuel Maria

«Verdeil tinha já voltado com o seu reverendo numismata, e havia também recrutado o vice-rei da Índia, D. Frederico de Sousa Calhariz, um conde Lucatelli, fanfarrão piemontês ou saboiano, seu inseparável companheiro, e um moço pálido, franzino e de aspecto singular, o senhor Manuel Maria, o mais extravagante e talvez o mais original dos poetas, que Deus tem criado.

«Aconteceu estar ele numa dessas excêntricas e exaltadas disposições de espírito, que, como o Sol no rigor do Inverno, aparecem quando menos se espera. Mil agudos conceitos, mil alegres e estouvados repentes, mil dardos satíricos, saíam da sua boca, e nós estávamos em convulsões de riso; porém, quando ele começou a recitar algumas das suas composições, em que a grande profundidade do pensamento se alia aos mais patéticos lances, senti-me comovido e agitado. Deste estranho volúvel carácter é que se pode dizer que possui o verdadeiro condão mágico com que, segundo lhe apraz, ora nos anima, ora nos petrifica!

«Percebendo quanto eu me sentia atraído para ele, disse-me Manuel Maria:

«’- Eu não esperava que um inglês condescendesse em prestar atenção alguma a um versificador moço, obscuro e moderno. Os senhores pensam que nós não temos nenhum outro poeta além de Camões, e que Camões não escreveu nada digno de menção senão os Lusíadas.’»

William Beckford: Viagens a Portugal, 1787.

O Manuel Maria aqui retratado é, evidentemente, Bocage. É este talvez o testemunho mais vivo que dele nos restou.

11.7.05

Vantagem competitiva

«Grande número de mendigos, cegos, mudos e chaguentos seguiram-me quase até à água. Não há mendigo em parte alguma que possa competir com o de Portugal: pela força dos pulmões, a riqueza das úlceras, a profusão da bicharia, a variedade dos farrapos - tudo isto junto a uma indomável perseverança.»

William Beckford: Viagens a Portugal, 1787.

O terrorismo como epidemia

O terrorismo com que hoje nos defrontamos não é causado nem pela miséria, nem pela opressão, nem pela humilhação, nem pelo preconceito cultural, nem sequer pelo fanatismo religioso, embora todos esses factores, e outros ainda, contribuam para lhe dar a feição que conhecemos.

Em última análise, o que se passa é que há uns tipos que têm um parafuso a menos e que por isso, na sua insanidade, julgam que matando gente a torto e a direito conseguirão encostar à parede não se sabe quem, e conseguir não se sabe o quê.

Este problema não tem solução, e, por isso, permanecerá connosco mesmo quando todas as actuais injustiças forem eliminadas e eventualmente substituídas por outras.

Embora eu diga que o problema não tem solução, é possível que os avanços da engenharia genética venham a breve trecho permitir-nos ajustar o tal parafuso que actualmente falta a certas pessoas. Só que essa solução repugna às nossas consciências, até porque, uma vez que se comece a apertar e a desapertar parafusos, ninguém sabe onde iremos parar.

Os fenómenos irracionais como o actual terrorismo associado ao fanatismo islâmico seguem um padrão evolutivo muito semelhante ao das epidemias virais: desencadeiam-se inesperadamente, expandem-se rapidamente, estabilizam e, finalmente, extinguem-se. Depois, sofrem mutações e ressurgem inesperadamente em diferentes lugares e diferenças circunstâncias. Um conhecimento mínimo da história do terrorismo mostra que é assim.

Por isso, sustento que a forma mais sensata e racional de encarar o terrorismo é como uma variedade de catástrofe natural. Isso significa que, embora se possa fazer muita coisa para detectar precocemente a preparação de actos terroristas, prevenir a eclosão das suas manifestações, controlar a sua expansão, minimizar os estragos que causa, e por aí fora, em última análise é impossível evitar que, aqui e ali, provoque alguns estragos que por vezes poderão atingir proporções colossais. Por outro lado, ele acabará mais tarde ou mais cedo por extinguir-se-á por si mesmo. Essa extinção será então festejada como uma grande vitória da guerra contra o terrorismo, mas na verdade terá pouco a ver com qualquer coisa que tenhamos feito.

Num plano estritamente objectivo, o problema do terrorismo tem uma dimensão, enquanto catástrofe humana, incomensuravelmente inferior à da sinistralidade rodoviária, dos tremores de terra e maremotos, da SIDA ou, principalmente, da malária. É portanto irracional mobilizar meios para o combater absolutamente desproporcionados em relação à dimensão real da ameaça.

Há quatro razões principais para a atribuição de uma absoluta prioridade ao combate ao terrorismo em detrimento de outros problemas que afligem a humanidade.

A primeira é o impacto mediático dos ataques, resultante da sua espectacularidade, que não pode deixar de impressionar o público e de pressionar os poderes políticos s tomarem medidas para «resolver» o problema. Os terroristas sabem que operam no negócio dos conteúdos, e não recuam perante nenhum efeito especial, por mais cruel que se afigure.

A segunda resulta de, ao contrário das catástrofes naturais, os actos terroristas decorrerem da acção deliberada de seres humanos, o que faz pensar que talvez eles possam ser dissuadidos, pela persuasão ou pela violência. de levá-los a cabo. Podia-se escrever um tratado sobre isto.

A terceira é a percepção (errada) de que a ameaça terrorista pode ser esconjurada de forma drástica e definitiva, na condição de ser atacada de uma forma persistente e resoluta e de ocorrer uma mobilização total do Estado e da sociedade para o combater. É o mito da «guerra contra o terrorismo», em si mesmo uma nova manifestação da ideologia totalitária contemporânea.

A quarta é o facto de uma exagerada preocupação com o terrorismo ser extremamente conveniente para, por um lado, impor uma agenda política dominada pelo medo e, por outro, persuadir os cidadãos a tolerarem entorses mais ou menos permanente às liberdades e garantias individuais em nome das exigências da segurança colectiva.

Uma mensagem pessoal

Miguel, deixa-te de merdas. Liga ao Luis e resolvam de uma vez por todas o assunto.

10.7.05

Sorteio ou nomeação?

Eu proponho que os árbitros sejam nomeados e os dirigentes desportivos sorteados.

No teatro

«Compunha-se o espectáculo de uma empolada tragédia em prosa, em três actos, intitulada Sesóstris, dois bailados, uma pastoral e uma farsa. As decorações não eram más, e os trajos eram pomposos.

«Um jovem de andar incerto, e olhar turvo, trajando o mais pesado luto, guinchou e roncou alternadamente o papel de uma princesa viúva. Outro adolescente, mal seguro nos seus sapatos de tacões altos, representava Sua Majestade egípcia, e garganteou duas árias com toda a nauseabunda suavidade de um aflautado falsete.

«Conquanto eu tivesse vontade de lhes esmurrar os ouvidos, por me terem tão grosseiramente aturdido os meus, o auditório foi de mui diversa opinião, e aplaudiu-os com o maior entusiasmo.

«No camarote do proscénio vi a afectada condessa de Pombeiro, que com os seus cabelos louros e a alvura da sua cútis fazia um primoroso contraste com a cor de ébano das duas criaditas pretas, que a ladeavam. O grande tom agora, na corte, é andar rodeado de favoritas africanas, tanto mais estimadas quanto mais hediondas, e enfeitá-las o mais ricamente possível. Foi a rainha que deu o exemplo, e na família real andam à competência em presentear dona Rosa, a negra beiçuda e desnarigada valida de Sua Majestade.»

William Backford: Viagens a Portugal, 1787.

Falta de meios

«A nossa segunda visita foi ao convento dos Teatinos. Aí, vimos a biblioteca, que se acha [em1787] na mesma confusão em que a deixou o terramoto [de 1755]: metade dos livros estão fora das estantes, em montões, cobertos de poeira.»

William Beckford: Viagens a Portugal, 1787.

Recomendação

Evidentemente, eu não acredito em horóscopos. Mas o do Público é o melhor.

9.7.05

O bloco-notas do Professor Espada

Lambrar conselho de G: Quando se gasta manteiga em grandes quantidades, compensa ir comprar ao Lidl.

8.7.05

Olhe, era um garoto, se faz favor...

O Tribunal Criminal do Funchal condenou António Fontes a pagar uma indemnização de 2.500 euros a Alberto João Jardim, por crime de difamação.

Com efeito, António Fontes escreveu em 2001 um artigo em que chama a Jardim «garotinho» e «jurista medíocre» e o considera «falho de princípios e dos mais elementares valores éticos e morais». Tudo acusações gravíssimas e caluniosas, como se vê.

Entretanto, o mesmo tribunal reconheceu que Jardim tem apelidado oralmente e por escrito os seus adversários de «rascas, rafeiros, incompetentes, covardes, mafiosos, parvalhões, abutres, malandros, canalhas, vigaristas, tarados, tontos, broncos, psiquicamente doentes e subversivos idiotas».

Agora a sério. Vivemos nós convencidos, na nossa santa ingenuidade, que em Portugal existe liberdade de expressão, e depois descobrimos que a lei em vigor permite condenações destas.

Imaginem agora que alguém chamava «garotinho» ao juiz. Não lhe chegaria certamente o prémio do Euromilhões para pagar a multa.

Amaral contra Bush

Luciano Amaral está zangado com George Bush, porque escutou William Kristol e ficou convencido de que o presidente americano se prepara para retirar do Iraque.

Amaral tem razão num ponto: tudo indica que Bush está de facto a tentar libertar-se do atoleiro em que se meteu. Não vejo, porém, onde está a admiração, porque há duzentos e tantos anos que os americanos se habituaram a partir a louça e sair sem pagar a conta. Uma vez terminada a exibição de força militar, está na hora de levantar a tenda e ir bombardear outro cometa.

Mas Amaral não concorda. É o fado dos doutrinários ficarem apegados a uma teima quando todos à sua volta já perceberam que ela não faz qualquer sentido. Para eles, quando as coisas dão para o torto, é a realidade que está errada, nunca as doutrinas.

Luciano Amaral escreve num jornal o que lhe vem à cabeça, George Bush tem a responsabilidade de dirigir os destinos da maior potência mundial. É essa a diferença, cuja relevância prática até este presidente é capaz de discernir.

Uma coisa é um sujeito pronunciar-se em abstracto sobre qualquer questão, com a ligeireza que decorre de não ter que assumir as consequências. Outra, bem diferente, é ordenar uma invasão que causou, segundo as melhores estimativas, 100 mil vítimas civis e não já sei quantas militares.

Nas escolas de gestão, é habitual chamar-se a atenção dos alunos para o facto de que resolver no papel um business case não é a mesma coisa que tomar graves decisões empresariais no dia a dia.

Uma decisão lógica e racional não é o mesmo que uma decisão existencial. Se Luciano Amaral procurar bem, um dia descobrirá que também há uns livros que explicam isso.

Só que a compreensão é algo diferente do entendimento. E também há uns livros que explicam isso.

A minha recomendação é que deixe de dar ouvidos ao Irving Kristol. Ele era trotskista, sabe?, uma seita cujo artigo de fé fundamental consistia na exportação da revolução. O engraçado é que ele nunca mudou de opinião. Limitou-se a encontrar algumas pessoas poderosas que lhe deram ouvidos.

Vencimentos da função pública

Futuros aumentos dos vencimentos da função pública deveriam ser condicionados à concretização de aumentos de eficiência e redução do desperdício da administração estatal.

Os sindicatos deveriam ser estimulados a colaborar nesse processo e ficar bem conscientes que, enquanto esse propósito não se concretizar, não poderão contar com aumentos salariais.

Assim é que estaria certo.

É difícil dizer bem

Apetece-me deitar foguetes por finalmente ler uma frase de Vasco Pulido Valente que posso subscrever sem reservas:

"Quando se escreve sobre a elite portuguesa em 2005 é prudente lembrar que ela paga para ler o Expresso e, se calhar, o lê com gosto."

Já quanto ao resto do artigo, não posso dizer a mesma coisa.

Frases que inspiram respeito

"Quero ser campeão" (Futebolista desconhecido, à chegada a Portugal)

7.7.05

Ora oiçam

Se este blogue tivesse música, hoje estaria a tocar o primeiro andamento da Sinfonia nº 1 de Brahms. Façam o favor de imaginar.

Globalização

À saída do seminário, um americano residente em Londres disse-nos que a cidade fora vítima de vários ataques terroristas ao princípio da manhã.

Várias pessoas presentes agarraram imediatamente no telemóvel para saberem como se encontravam amigos e familiares que residem na cidade.

É isto que me agrada na globalização: torna imediata e palpável, em momentos como este, a unidade essencial do género humano.

E, contra isto, o terrorismo nada pode fazer. Pelo contrário, só ajuda.

Afinal os blasfemos são uns anjinhos

João Miranda pergunta no Blasfémias porque é que a direita, quando chega ao poder, não é liberal.

Há uma resposta simples: porque a direita, de facto, não é liberal, excepto naquele sentido corriqueiro, vulgar e ofensivo para o liberalismo, de que por vezes lhe convém a liberdade da raposa no galinheiro livre.

Sim, eu sei que as coisas são mais complexas, que há muitas nuances, que é errado ver o mundo a preto e branco, e por aí fora. Ainda assim, convém não perder de vista o essencial, e o essencial é que a direita não passa da expressão política do egoísmo, exprimindo-se sociologicamente sempre e em todos os tempos através da aliança entre o privilégio e a ignorância.

A direita liberal é, no essencial, uma história da carochinha, um conto de fadas para intelectuais. A direita é liberal no mesmo sentido em que os comunistas são democratas, ou seja, num sentido que não faz qualquer sentido para o comum dos mortais.

Já pensaram nisto?

Somos todos empregados não pagos do Blogger, que é como quem diz do Google.

6.7.05

Sociedade do conhecimento à portuguesa

Vendo bem, o cimento é a genuína massa cinzenta.

Adivinha

Porque é que o PSD, Pacheco Pereira incluido, trata com tanta delicadeza o Dr. Alberto João Jardim?

Simples: porque, sem o PSD Madeira, nunca teria conseguido formar governo neste país.

Tele-escola

Sem dúvida por causa do esforço de contenção das despesas públicas, muitas pessoas com invejáveis dotes professorais estão agora a arranjar emprego como repórteres de televisão.

Vai daí, os telejornais tornaram-se em lições de coisas ou sessões de doutrinação, em que zelosos apóstolos nos ensinam como devemos comportar-nos nos mais variados momentos e situações.

O botãozinho da algibeira

"Ali estavam bispos, prelados das ordens religiosas, secretários de Estado, generais, gentis-homens da câmara e cortesãos de todas as qualidades, tão elegantes e vistosos quanto os podiam fazer os uniformes bordados, as comendas, as cruzes e as chaves de ouro.

(...)

"Metade dos circunstantes dobravam o joelho, uns com petições, outros com memoriais, aqueles pedindo lugares e promoções, estes bençãos, de que o meu reverendo condutor [o grande inquisidor] não era decerto pródigo. Ele parecia tratar todas estas vivas demonstrações de adulador servilismo com o modo mais desdenhoso, e, cortando pela multidão, que se afastava respeitosamente para nos dar passagem, chamou por acenos o visconde de Ponte de Lima, o marquês de Lavradio, o conde de Óbidos e dois ou três fidalgos mais, que estavam de serviço, para um quarto pequeno e baixo, que não tinha mais de vinte pés de altura por catorze de largura.

"Depois de muitos cumprimentos adulatórios, no tom mais submisso, da parte dos cortesãos, pelos quais eles não receberam senão repulsas e resmungadelas, o arcebispo chegou a sua cadeira para junto da minha, e disse com voz muito clara e alta:

"«- Meu caro inglês, tudo isto é uma súcia de marotos aduladores: não acredite nem uma palavra do que eles lhe disserem. Apesar de brilharem como ouro, a lama não é mais vil: eu conheço-os bem. Aqui está - continuou ele, pegando-me na aba da casaca - uma prova da prudência inglesa. Este botãozinho para segurar a algibeira é uma invenção preciosa, especialmente na grande sociedade; não o tire, não adopte nenhuma das nossas modas, ou terá de se arrepender.»"

William Beckford: Viagens a Portugal, 1787.

5.7.05

Os media e o crime

Nao percam este notavel post do Nuno Guerreiro sobre os media e o crime, incluindo um guia-relampago de como fazer mau jornalismo e a revelaçao bombastica da ascendencia judaica de um neo-nazi portugues.

A excepçao e a regra

Esta historia dos aniversarios dos blogues esta a tornar-se numa praga, a pontos de eu ter jurado a mim mesmo acabar com as felicitaçoes. Mas como deixar passar em claro o do Bloguitica? Va la, abre-se uma excepçao...

Capitalismo mamão

O PS continua fiel à sua velha máxima segundo a qual compete ao Estado promover o desenvolvimento de negócios lucrativos para o capital privado. É essa a orientação essencial que subjaz ao plano de investimentos hoje apresentado.

Isto é grave. Não só porque está provado que nas parcerias público-privadas são sempre o Estado e os contribuintes que ficam a perder, mas, sobretudo, porque os capitais privados que vão financiar as gigantescas obras públicas agora anunciadas vão ser desviados doutras aplicações mais importantes para dotar o país das empresas competitivas de que necessita.

Portugal é, creio eu, o único país europeu cujos grandes grupos económicos se encontram orgulhosamente ausentes de actividades económicas abertas à competição internacional. Isto é dramático, porque todo o esforço de exportação de bens e serviços recai, para além de multinacionais como a Auto-Europa, sobre pequenas e médias empresas sem dimensão para potenciarem as vantagens competitivas do país.

Quanto às grande empresas, que têm a capacidade de financiamento e os quadros em quantidade e qualidade, optam por se resguardar da concorrência externa, focalizando as suas atenções em actividades protegidas por barreiras naturais ou institucionais. E fazem muito bem: por que haverão elas de correr riscos, se conseguem obter tranquilamente rentabilidades muito satisfatórias?

O capitalismo funciona bem quando nao existem incentivos perversos que desmotivam a inovação e a produtividade. O novo plano de investimento do governo PS é um desses incentivos perversos: os investidores, que acorreram em grande número à sua apresentação, ficaram a saber que, uma vez mais, não vão ter que se ralar demasiado, porque o Estado vai continuar a velar por eles.

O grande inquisidor

"Aqueles que esperam encontrar no grande inquisidor de Portugal um rosto seco e lúgubre, e um olhar reprovador e de maldição, ficam logrados. Raras vezes a gente tem o prazer de ver uma fisionomia mais agradável, mais jovial, do que aquela com que o céu benignamente o dotou.

"Recebeu-me da maneira mais franca e cordial, e tenho razões para crer que estou em grande valimento junto da sua pessoa. Conversámos acerca de os arcebispos em Inglaterra serem casados."

William Beckford: Viagens a Portugal, 1787.

A orquestra da rainha

«A orquestra da capela da rainha de Portugal ainda é a primeira da Europa; em excelência de vozes e instrumentos nenhuma outra corporação deste género, nem mesmo a do papa, se pode gabar de ter reunidos tão admiráveis músicos como estes.

«Para onde Sua Majestade vai eles acompanham-na, seja a uma caçada de altanaria em Salvaterra, seja a caçar a saúde nos banhos das Caldas. No meio destes rochedos e montes agrestes, aqui mesmo ela está rodeada de um rancho de mimosos cantores, tão gordos como as codornizes, tão gorjeadores e melodiosos como os rouxinóis. Os violinos e os violoncelos de Sua Majestade são todos de primeira ordem, e em flautas e oboés a sua ménagerie musical não tem rival.»

William Beckford: Viagens a Portugal, 1787.

Pequena e média corrupção

As últimas semanas recordaram-nos mais uma vez a realidade de um país minado pela pequena e média e corrupção.

Lembram-se daqueles autarcas que levavam os amigos a passear de helicóptero à custa do erário público? E daquele comandante de bombeiros que abastecia integralmente o quartel numa empresa comercial de que era proprietário? E daquele outro quartel que comprava carros livres de impostos para o filho do Sousa Cintra?

Alguns destes pequenos (ou não tão pequenos) entorses à legalidade conquistaram com o tempo o estatuto de direitos adquiridos, e é assim que a assistência na doença dos polícias cobre toda a família alargada, que os médicos dos hospitais públicos só cumprem metade do seu horário de trabalho, que os juízes beneficiam de férias prolongadas, que os professores deixam de trabalhar um ano antes de passarem à reforma, que milhares de delegados sindicais são dispensados de dar aulas, que pseudo-candidatos às eleições autárquicas gozam férias extra, e por aí fora.

Numa sociedade bem organizada, os comportamentos desviantes são penalizados por três tipos de sanções: as legais, as sociais e as morais.

Do que mais carecemos, como se vê, é das sanções sociais, pois que as outras sem estas não vão longe. É por causa da ausência de sanção social que os titulares de privilégios exorbitantes e infundados não se envergonham de exibir e defender publicamente o seu egoismo sem limites. Eles sabem que ninguém vai deixar de considerá-los por isso. Bem pelo contrário, é muito provável que os amigos e os vizinhos os felicitem "por não se deixarem explorar".

O Estado social não foi inventado para satisfazer os caprichos de grupos de trabalhadores com suficiente poder reivindicativo para imporem a sua aceitação, mas para proteger os fracos que de facto precisam de protecção.

4.7.05

Os nossos e os deles

«Os sapos portugueses serão mais avantajados em volume, mas não tão bem malhados como os que nós temos a ventura de hospedar em Inglaterra.»

William Beckford: Viagens a Portugal, 1787.

Esta minha cabeça...

Topando por mero acaso com este post do Pedro Mexia, que, pelos vistos, tambem nao gosta de praia, lembrei-me finalmente quem é que eu queria felicitar: era o Ivan!

E eu que nem gosto de praia...

Tenho a certeza de que ontem à noite escrevi um post com este título, mas agora chego ao blogue e não o vejo.

Terei sonhado? Mas eu ia jurar que o escrevi mesmo. Tratava de... Parece-me que era sobre o segundo aniversário de um blogue... Mas que blogue seria?

Se entretanto me lembrar eu depois digo.

Cavalgada

«Permanecemos no salão até que de todo escureceu, e partimos. Os batedores com archotes acesos galopavam na nossa frente a toda a brida; o vento atirava-nos o fumo e as fagulhas para a cara, e eu sentia-me aturdido e arrebatado, e experimentava uma sensação talvez semelhante à de um bruxo noviço, que se achasse pela primeira vez montado numa vassoura, à garupa de uma feiticeira! Em menos de uma hora galgámos ruidosamente doze milhas de áspera e revolta calçada, subindo e descendo os mais íngremes montes num galope a tal ponto precipitado que eu esperava a todo o instante ver-me estendido de nariz no chão; porém, felizmente, as mulas tinham sido escolhidas entre cem talvez, e nunca tropeçaram.

«Nas alturas sobranceiras à Ajuda senti o ar muito fino e cortante. Causa decerto estranheza queixar-se a gente de frio a 9 de Julho, e em Lisboa!»

William Beckford: Viagens a Portugal, 1787.

2.7.05

Não se deve deixar morrer este assunto

Recomendo a leitura de uma lúcida análise retrospectiva em O céu sobre Lisboa sobre o que de facto terá sido o célebre "arrastão" da praia de Carcavelos.

O mais fantástico, para mim, é que, passado todo este tempo, nenhum dos grandes meios de comunicação de massa responsáveis pela difusão da pseudo-notícia se tenha sentido na obrigação de escalpelizar o tema e de pedir desculpa publicamente pela responsabilidade que lhe coube no injustificado alarme criado.



Antes que me esqueça

Parabéns ao Adufe, que hoje completa dois anos de existência.

A fio de Espada

A mim, não me chocam particularmente as opiniões do Professor Espada. Enquanto opiniões, são apenas isso: uma forma pessoal de ver o mundo que merece, pelo menos em princípio, tanto respeito como qualquer outra.

O que me incomoda e me desgosta é o sistemático e constante recurso à mentira - digo bem: à mentira - para apoiar as suas ideias.

Já aqui apontei exemplos no passado.

Hoje mesmo, escrevendo no Expresso, o Professor atribui "em grande parte" a Rousseau "a ideia bizarra de que um governo grande seria aceitável - e até mesmo desejável - desde que fosse um «governo do povo»", sendo evidente, no contexto do artigo, que a expressão "governo grande" é entendida como sinónimo de Estado omnipresente e tentacular, e, por decorrência, de elevada carga fiscal.

Não é preciso ser-se um grande especialista de Rousseau para se saber que ele jamais defendeu algo do género, e que a Revolução Francesa - outro bode expiatório favorito do Professor Espada - não levou à criação de um Estado mais poderoso do que aquele que existia anteriormente.

Acontece que, sendo o Professor Espada professor de Ciência Política, ele não pode desconhecer isto. Se ele quer apontar à execração pública um teorizador do totalitarismo, poderia descarregar antes a sua fúria sobre Thomas Hobbes.

Mas é claro que isto não seria muito bem visto nas universidades britânicas que ele frequenta, onde a forma mais eficaz de obter apoio para um qualquer ponto de vista consiste, ainda hoje, em atribuir a opinião contrária a um francês - ou, pelo menos, a alguém com um nome francês, dado que Rousseau era genebrino.

Cães e higiene pública

«Despertaram-me alta noite os hórridos latidos dos cães. (...) De todas as capitais em que tenho vivido, Lisboa é a mais infestada por alcateias destes afaimados animais, que prestam o serviço de limpar as ruas de uma parte, pelo menos, das pouco aromáticas imundícies.»

William Beckford: Viagens a Portugal, 1787.

Não tenho lágrimas para o Barnabé

Mais uma vez, concordo a cem por cento com o Lutz. Ele explica muito melhor do que eu seria capaz porque é que há longo tempo o Barnabé foi riscado dos meus links permanentes.


1.7.05

Os 100 dias

O principal mérito dos primeiros 100 dias do Governo foi reduzir a pó o mito da grande obra de saneamento financeiro da Drª Ferreira Leite.

Está agora perfeitamente claro que, tirando alienar património do Estado em condições discutíveis, ela nada mais fez em dois anos à frente do Ministério das Finanças.

Em parte, isso deve-se ao facto de que nem ela nem o Governo a que pertencia sabiam fazer mais.

Mas há uma razão mais profunda para o seu fracasso. É que, na perspectiva da nossa direita, a crise financeira é apenas um pretexto para desmantelar o Estado Social.

Nada mais lhe interessa para além disso.

O regresso do Guerreiro

O contra-almirante na reserva Martins Guerreiro está indignado por a deputada Zita Seabra ter afirmado num recente programa de televisão que, no 25 de Novembro, "o PCP tinha a Marinha, mas só com a Marinha não se fazem revoluções".

Argumenta Martins Guerreiro que essas declarações foram sentidas como "uma ofensa à instituição" e "ao brio e à honra dos militares da Marinha".

A propósito do que se passou no dia 25 de Novembro, afirma o impagável contra-almirante: "Posso garantir que a linha de comando da Marinha se manteve sem rupturas, bem como a articulação com o Presidente da República, por isso é calunioso dizer que o PCP tinha a Marinha ou sequer sugerir que as posições da Marinha eram influenciadas pelo PCP".

A lógica deste raciocínio escapa-me um bocadinho, para não dizer que me foge completamente.

Mas o que eu queria de facto dizer é que fiquei surpreendido comigo mesmo por constatar que, ao fim de tantos anos, tiranetes como este ainda me provocam urticária.

Podem encomendar as sacas de cimento, o cheque já vem a caminho

O Ministério da Economia divulgou um grandioso plano para investir 25,1 mil milhões de euros.

Mas, vai-se a ver, e afinal não é bem assim, porque 17,1 mil milhões será investimento privado. Espero sinceramente que não estejam a contar comigo, dado que de momento não tenho liquidez por causa de uma cadeia de supermercados que comprei na Polónia e de um resort no Nordeste brasileiro que já está apalavrado.

O pior, no entanto, é que não se sabe bem em que é que o Estado pretende investir. Será em aeroportos? Será em comboios? Será na energia? Será na rede de abastecimento de águas?

Ah, bom! É em cimento? Pronto, é que eu não estava a perceber!

Não se arranja ninguém para trabalhar...

Agraedeço o cuidado de todas as pessoas que têm alvitrado sugestões para resolver o problema da minha caixa de comentários, mas, infelizmente, nenhuma deu resultado.

Parece que vou ter mesmo que chamar o canalizador (picheleiro, para a malta do Porto).


William Beckford.

Nos Jerónimos

«Não pode haver nada mais belo, como espécimen de bem trabalhada escultura gótica, do que esta complicada e esmaltada profusão de arcarias ligeiras e de cinzelados pináculos, onde os doze apóstolos nos seus nichos, debaixo de dosséis formados por milhares de cordões.»

William Beckford: Viagens a Portugal, 1787.

Sob o aqueduto

«Afrontei o sol, e caminhei para aquele lado do vale através do qual se ergue o enorme aqueduto, de que já ouvisteis falar como da mais colossal construção do seu género. Tem uma só ordem de arcos em ogiva, e o maior de todos, por onde passa uma rápida queda de água, mede para cima de duzentos e cinquenta pés de altura. As pontes do Gard e de Caserta têm várias fileiras de arcos sobrepostos, que, dividindo a atenção, diminuem o efeito geral do monumento: aqui há uma tal grandeza nesta simples arcaria, que nos enche de assombro! Sentei-me numa pedra, debaixo do arco grande, e pus-me a contemplar aquela abóbada, erguida a tanta altura acima de mim, com um sentimento de respeito não isento de terror, como se aquele monumento, que eu admirava, fosse obra de algum ser imenso dotado de forças gigânteas, que pudesse lembrar-se de sacudir e desmanchar a sua obra, e ter o mau gosto de me reduzir a pó!»

William Beckford: Viagens a Portugal, 1787.

Ao clarão da lua cheia

«Parte do nosso trajecto, na volta para casa, foi feito ao sereno clarão da lua cheia, que se erguia detrás das montanhas do outro lado do Tejo, que tem, neste extremo da metrópole, mais de nove milhas de largo. Lisboa, que horas antes me parecia tão pouco interessante, assumiu um outro aspecto ao doce raiar da lua. As escadarias, os terraços, as capelas e os pórticos de muitos conventos e palácios, à beira do rio, alvejavam como se fossem de mármore branco, enquanto as rudes encostas e os seus miseráveis tugúrios, erguendo-se, ao fundo, acima deles, se perdiam na densa escuridão.»

William Beckford: Viagens a Portugal, 1787.

Sob a forte luz do meio-dia



Sob a direcção de Furtwangler, cada trecho da 5ª Sinfonia de Beethoven ganha um relevo e uma intensidade tais que, durante dias, a música não me sai da cabeça.


William Beckford.

Uma aglomeração de aldeias

«Quanto melhor se conhece Lisboa, menos esta cidade corresponde à expectação provocada pelo seu magnífico aspecto quando vista do rio. Se um viajante pudesse ser transportado, repentinamente e sem prevenção, a muitos pontos da cidade, concluiria com razão que tinha atravessado uma série de aldeias grosseiramente unidas entre si, e dominadas por maciços conventos. As igrejas, em geral, são de péssimo gosto arquitectónico, o gosto de Borromini, com as molduras recortadas, e as repolhudas cornijas e torrinhas um pouco no estilo dos antigos armários de relógio, que Boucher desenhava com muitos arrebiques e floreados, para adornarem os aposentos de madame Pompadour.»

William Beckford: Viagens a Portugal, 1787.

Um regresso

Nos últimos meses, a lista dos links permanentes aí ao lado tem vivido em permanente sobressalto mercê dos constantes encerramentos de diversos blogues muito cá de casa.

No meio de toda esta agitação, é bom saber que A Destreza das Dúvidas está de volta, e agora melhor do que nunca, porque desapareceu do cabeçalho aquela citação um bocadinho absurda, em que um sábio chinês dizia já não sei bem o quê sobre a não-linearidade.

Feliz regresso, Luis!