13.7.05

Beatos

«Marialva tremia todo, tanta era a devoção, e o mesmo fazia o seu companheiro, cujos joelhos estão calejados do frequente ajoelhar, e que, se dermos crédito a Verdeil, acabará os seus dias num eremitério, ou doido, ou talvez ambas as coisas. Pretende ele também que este velho frade é que tem contribuído para aumentar o devoto zelo de Marialva, e que os dois, animando-se mutuamente, devem em breve produzir frutos dignos de Bedlam [hospício londrino para alienados], senão do Paraíso. O que é certo é que este religioso pode-se gabar de ter um aspecto conspicuamente beato, e uma forma vigorosíssima de bater nos peitos; porém isto não o deve desvanecer muito: há em Lisboa pelo menos cinquenta ou sessenta mil boas almas que, sem terem viajado tanto, castigam-se tão ruidosamente como ele. Esta manhã na [igreja da] Boa Morte, um velho pecador permaneceu durante toda a missa com os braços abertos, na posição e com a inflexível rigidez dos antigos candeeiros de braços, e outro contrito personagem comoveu-se tanto, no momento da consagração, que assentou o nariz no pavimento e lambeu a espessa camada de pó e lama de que ele estava coberto.»

William Beckford: Viagens a Portugal, 1787.

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