30.9.05

Porque sim

Seja por que misteriosa razão for, cerca de metade dos portugueses que tencionam votar nas presidenciais querem ver Cavaco Silva em Belém.

Trata-se, pois, daquilo a que se pode chamar um candidato consensual.

Tal como as celebridades são principalmente célebres por serem conhecidas, Cavaco será eventualmente Presidente porque os seus compatriotas estão convencidos de que assim será.

Quem disfruta à partida de uma posição tão vantajosa não deve arriscá-la com declarações fracturantes, susceptíveis de lançarem a confusão e de inspirarem receios na sua base de apoio.

Qualquer intenção de reformar o sistema - como querem tantos dos seus apoiantes - deve ser silenciada. A estratégia mais inteligente é, nas presentes circunstâncias, a defesa.

Cavaco candidatar-se-á porque sim. Algumas banalidades bem embrulhadas bastarão para compor um discurso ganhador.

Com isto, suscitará inevitavelmente a irritação dos exaltados que, na sua entourage, apostavam tudo no golpe constitucional.

Para dar expressão a essa ala, é possível que Portas avance. Isso permitir-lhe-á satisfazer a vaidade pessoal, mas não creio que prejudique as chances de eleição de Cavaco, embora possa forçá-lo à segunda volta.

Simplifiquemos

A confirmar-se que Cavaco Silva não tem concorrência à altura, o melhor seria contratá-lo por ajuste directo.


Piranesi.

A direita e a cultura

Anda certa direita muito atarefada a procurar superar uma relação alegadamente complexada com a cultura.

Num artigo publicado no DN de hoje, Pedro Lomba faz-nos o compte-rendu de um heróico debate das "Noites à Direita", no decurso do qual, assevera-nos ele, a tese marxista "foi desmistificada". Muito folgo.

Mas borra a pintura na conclusão da sua prosa auto-confiante, quando afirma:

"Quando estas [as utopias] faliram, os intelectuais voltaram para casa. Onde estão melhor."

Isso mesmo, em casa, onde não podem incomodar ninguém. (Como as mulheres, não é verdade?) A cultura é uma coisa muito bonita, mas convém que haja recato.

Moral da história: Ninguém consegue desmentir os seus instintos.

O fim do mundo

Aqui há uns anos, as barracas acabaram oficialmente em Portugal.

Não passou muito tempo desde então, mas basta passar na 2ª Circular de Lisboa, ali junto ao Aeroporto, para constatar que elas estão de volta.

Imagino o que não será em zonas mais recônditas dos subúrbios, convenientemente escondidas dos olhares da classe média que circula de carro.

Estes novos bairros de lata têm novos habitantes. São na sua quase totalidade imigrantes remetidos por uma legislação iníqua para a semi-ilegalidade. Não têm praticamente nenhuns direitos. Acima de tudo, não votam; logo, não contam.

Temos que olhar para isto de frente.

O dilema dos prisioneiros

Porque é que o desemprego é mais baixo nos EUA do que na Europa?

Mas será mesmo?

Certas circunstâncias usualmente não consideradas podem ter um impacto considerável sobre os níveis do desemprego.

Por exemplo: nos EUA, cerca de 2% da população está na cadeia fechada a sete chaves. Por conseguinte, embora se encontre excluída do mercado de trabalho, não figura nas estatísticas de desemprego.

Na Europa, excluindo países bárbaros como Portugal e a Rússia, a taxa equivalente ronda os 0,1%.

Logo, esta disparidade nas políticas de combate ao crime explica qualquer coisa como 1,9 pontos percentuais da diferença entre as taxas de desemprego nos EUA e na Europa.

Agora imaginem vocês o que sairá mais barato ao Estado: pagar um subsídio a 1,9% de desempregados, ou suportar o seu alojamento e alimentação em estabelecimentos prisionais suportados pelos contribuintes?

Diferentes perspectivas sobre o que deve ser o Estado Social...

29.9.05

Vitórias morais

Eu não vi o jogo de ontem à noite. Não preciso de ver o que consigo perfeitamente imaginar.

Estúpidos

Estúpidos, rematados estúpidos. Pois que outro nome se há-de dar a essa metade dos portugueses que se compromete a dar o seu voto a alguém que não só não se sabe o que quer como nem sequer manifestou ainda a sua intenção de se candidatar a Presidente da República?

PS - Acabo de ver esta mesma ideia expressa aqui, embora numa linguagem mais polida.

Batatas americanas e cebolas europeias

Todos nós aprendemos (ou deveríamos ter aprendido) na escola que não faz sentido somar batatas com cebolas.

Todavia é exactamente isso que se faz quando se calcula o Produto Nacional Bruto - desde logo razão bastante para ficarmos alerta. Vai daí, os economistas inventaram certas técnicas engenhosas e razoavelmente consensuais para resolverem o problema a contento.

As coisas tornam-se mais complicadas, porém, quando se comparam os PNB de vários países e as respectivas taxas de crescimento.

Por exemplo, "toda a gente" sabe que, na última década, a ecomomia americana tem crescido de forma consistentemente mais rápida do que a economia europeia. O que, todavia "toda a gente" ignora é que isso só começou a acontecer desde que os EUA alteraram o método de estimativa do seu PNB.

O novo método procura ter em conta que, hoje em dia, certos bens (computadores, por exemplo) aumentam continuamente de qualidade sem aumentarem de preço. Como isso implica uma melhoria do bem-estar dos consumidores, esse ganho deveria ser estimado e somado ao PNB. É isso que os EUA começaram a fazer de há uma década para cá.

Em teoria, parece tudo certo. A verdade, porém, é que esse método de cálculo conduz a taxas de crescimento praticamente duplas das obtidas pelo método anterior.

Consequência: como a Europa não usa o mesmo método, parece que o seu PNB cresce muito mais devagar. Se ambas as regiões o calculassem do mesmo modo, as diferenças seriam insignificantes.

Moral da história? Tirem-na vocês.

Barretes

A propósito de barretes entusiasticamente incensados pela crítica, Charlie e a Fábrica de Chocolates é outro. "Belíssimo, belíssimo."

27.9.05



Piranesi.

24.9.05

Jornalismo zero

Em post-scriptum ao editorial de hoje d'O Público, Amílcar Correia indica que nas páginas 8 e 9 do jornal poderá ser encontrada "mais informação que vem confirmar que dirigentes socialistas tinham conhecimento prévio dos planos de regresso de Fátima Felgueiras e que levaram à sua libertação".

Pacientemente consultadas as referidas páginas, nada encontrei senão novas insinuações carentes de fundamentação.

Se O Público quer manter a sua história, a única coisa que tem a fazer é revelar quem são os dois membros do secretariado nacional do PS que terão mantido conversações com Fátima Felgueiras com vista à preparação do seu regresso. Caso não o faça, teremos que concluir que as afirmações do jornal foram gratuitas e irresponsáveis.

Que me recorde, nunca O Público desceu tão baixo.

23.9.05



Piranesi.

22.9.05

"There's no such thing as society"

Num raro assomo de profundidade filosófica, a Srª Thatcher pronunciou certa vez a frase em epígrafe.

Algumas pessoas (aqui, por exemplo), usualmente dadas ao individualismo metodológico, acreditam na existência das entidades individuais, mas negam a das colectivas. Assim, fará sentido falar-se de "eleitores", mas não de "eleitorado", o qual não passaria de uma colecção de eleitores individuais.

Sem entrar em detalhes, convém assinalar que, de Wittgenstein para cá, a filosofia analítica se encarregou de questionar que espécie de realidade pode de facto ser atribuída a uma coisa aparentemente tão óbvia como um eleitor individual, e isso porque também ele é constituído de diversas partes integrantes relevantes para a sua unidade.

Uma versão mais sofisticada desta discussão consiste em fazer notar que, mesmo que se reconheça a existência real de certas entidades colectivas, não fará sentido falar-se de escolhas do eleitorado no mesmo sentido em que se fala de escolhas de um eleitor. E este argumento parece muito convincente até ao momento em que somos confrontados com dados empíricos sobre o comportamento dos indivíduos que só podem ser explicados pelo facto de que, na verdade, os indivíduos não fazem escolhas nenhumas. Por outras palavras, é tão questionável a ideia de que os eleitores fazem escolhas como aqueloutra de que o eleitorado opta por isto ou por aquilo.

Em que ficamos então?

Na minha qualidade de adepto do pragmatismo americano, comungo do relativismo ontológico de W. V. Quine. Por outras palavras, estou disposto a aceitar provisoriamente a existência de quaisquer entidades que pareçam ser relevantes para explicar uma dada situação, sejam elas quarks, demónios ou eleitorados. Nessas condições, posso mesmo reconhecer utilidade - e, logo, realidade - a uma entidade em certas circunstâncias, mas não noutras.

Dito isto, o problema (real) de se atribuírem vontades ou intenções a um eleitorado é outro. Todos sabemos que, através do voto, os cidadãos não podem pronunciar-se especificamente sobre este ou aquele ponto particular do programa de um partido. Ao votarem nele, limitam-se a dar-lhe uma caução global em resultado de complexos mecanismos de avaliação cuja explicação nos escapa. Por conseguinte, do facto de alguém ter votado no SPD nas últimas eleições alemãs não se segue necessariamente que seja favorável à Agenda 2010, por exemplo.

Para complicar ainda mais as coisas, mesmo quando, como é o caso em referendos, os eleitores se pronunciam sobre uma única questão, sabemos que o resultado da consulta depende das regras específicas da votação, sendo que não existe uma regra que possa ser indiscutivelmente considerada mais justa do que as alternativas. Até já houve um sujeito (Ken Arrow) que ganhou um prémio Nobel da Economia por demonstrar isto.

Por conseguinte, quando dizemos que o eleitorado se pronunciou neste ou naquele sentido, estamos apenas a formular uma opinião (ou uma hipótese), não a enunciar um facto objectivo e inquestionável. Com alguma sorte, pode ser que a evolução posterior dos acontecimentos ajude a esclarecer se essa opinião estava ou não correcta. Mas nem isso é certo.

Desde que isto esteja claro, não será muito grave dizer-se que o eleitorado "recusou", "rejeitou", "condenou", "aprovou", "escolheu", "receou", "desejou","sentiu", "desconfiou de" ou "enviou uma mensagem a ".

Mas é verdade que, demasiadas vezes, se usa e abusa de expressões deste tipo para manipular a percepção pública do que aconteceu ou está a acontecer. E, nesse sentido, partilho em absoluto da preocupação do Pedro Magalhães.

É preciso conservar a compostura

O Sporting esteve 18 anos sem ganhar o campeonato. A direita anda há 30 anos a tentar levar um candidato seu a Belém.

Percebe-se a euforia, agora que se vislumbra uma séria possibilidade de isso poder vir a acontecer.

Todavia, convém manter a cabeça fria.

Pacheco Pereira, por exemplo, tem idade e estatuto para não escrever tonterias como a que assina hoje n'O Público a propósito de uma sondagem semi-humorística do Expresso que pretende evidenciar as forças e fraquezas de cada um dos candidatos.

Cavaco, o "confiável", a tomar conta das finanças? Soares, o "nonchalant", a deixar andar?

Ora, ora, meus amigos, trabalhem melhor esse argumentário, senão ainda vão ter dissabores. É muito fácil recordar que foi precisamente um governo presidido por Soares que teve que limpar a confusão deixada por Cavaco na sua pródiga passagem pelo Ministério das Finanças no governo da AD.

Vamos partir do princípio que foi só um lapso de memória de Pacheco Pereira, que na altura até já era crescidinho. Acontece aos melhores...

Contrates

O que o mapa eleitoral alemão revela não é nem a oposição entre Leste e Oeste, nem a oposição entre Norte e Sul.

É a oposição entre as cidades e os campos. Como nos EUA. Como cá.

21.9.05



Adriana Molder.

20.9.05

O drama alemão

Tendo em conta que Schroeder provocou a convocação de eleições antecipadas para encostar à parede aqueles que, no SPD, se opunham ao seu programa de reformas;

Tendo em conta que a CDU não discorda de nenhuma dessas reformas;

Tendo em conta que o FDP deseja claramente essas e muitas outras reformas de cariz liberal;

Tendo em conta tudo isso, parece evidente que 80% do eleitorado alemão se pronunciou a favor da implementação imediata da Agenda 2010.

Sendo assim, qual é o problema?

O verdadeiro problema, para José Manuel Fernandes e para outros que pensam como ele, é que George Bush não terá uma amiga à frente do governo da República Federal. Esse é que é o drama.

19.9.05

Falta de pachorra

É cómica esta tendência dos portugueses para a dramatização extrema e para verem "impasses" e "bloqueios" por toda a parte. Por outras palavras: esta tendência para se carpirem em vez de fazerem algo para superar os problemas que ocorrem.

Mais cómico ainda é constatar-se que este método se aplica inclusive a temas de que estão muito arredados, de que pouco sabem e que, muito provavelmente, menos ainda lhes interessam, como é o caso dos resultados das recentes eleições alemãs.

E que tal escutar antes, num registo completamente distinto, o que um alemão sensato tem para nos dizer?



Menez.

Desventuras da verdade

José Manuel Fernandes perdeu as eleições na Alemanha. Inconformado, escreveu isto n'O Público de hoje:
O resultado das eleições alemãs de ontem - o mais inconclusivo do pós-guerra - mostra até que ponto é difícil conquistar o eleitorado com base num plataforma reformista e falando verdade, designadamente sobre os impostos.

Notem bem: as opiniões de JMF e das pessoas que pensam como ele sobre uma dada situação político-económica não são apenas opiniões a ter em conta. São "a verdade".

Por conseguinte, as eleições não servem para os eleitores escolherem o rumo que entendem ser o melhor para o seu país. Servem para sufragar ou contraditar a verdade.

Este reiterado recurso à expressão "política de verdade" traz água no bico. No fundo, o que quer sugerir é que as restantes opiniões e políticas não são, no fundo, legítimas. São "políticas de mentira".

Se estivesse menos irritado, JMF teria notado que, ao contrário do que pretende, o programa eleitoral da CDU não era de forma alguma reformista. E que, pelo contrário, o FDP, o único partido que de facto propôs reformas liberais, foi aquele cuja votação mais cresceu.

A democracia não é tão má como a pintam.

Não é um trabalho, mas alguém tem que fazê-lo

A universal aflição com a nomeação de Oliveira Martins para o Tribunal de Contas admite como pacífica a ideia de que essa instituição serve para alguma coisa.

Não serve, excepto para produzir notícias para os jornais.

Logo, seria mais útil que os ilustres opinantes concentrassem antes os seus esforços a sugerir o que deveria ser feito para alterar o actual, e lamentável, estado de coisas.

18.9.05



Menez.

Bruxware

Quando algo no nosso computador não funciona correctamente, pedimos ajuda a um informático.

E que faz ele? Desliga-o e volta a ligá-lo.

Se o problema persiste, desinstala o programa e volta a instalá-lo.

Se nem assim consegue resolvê-lo, recomenda uma nova versão do Windows, quando não um novo computador.

Ou seja, eles não sabem verdadeiramente o que se passa, nem entendem qual a sua causa. Por isso recorrem a um método que equivale a consertar uma televisão dando-lhe umas pancadas com o punho.

Começo a acreditar que, no fundo, a informática é como a bruxaria: às vezes funciona, outras vezes não.

E desconfio que, quando os informáticos já não sabem mais o que fazer, vêm à noite ao escritório às escondidas para fazer umas rezas e esconjurar o mau olhado.

Mais uma pirueta

Revelando mais uma vez o seu pouco notado, mas indesmentível, oportunismo político, Vasco "Pulido Valente" passa-se hoje definitivamente para o outro lado. Depois de ter feito coro com Alberto João Jardim a exigir a mudança do regime, ei-lo a sustentar agora que é perigoso pôr em causa os privilégios das autoridades.

A degradação do nível de argumentação é manifesta. Vejam como ele se desdiz na mesma frase:

"Como se irá convencer esta gente, a autoridade, que vive em grande parte do seu estatuto social, que deve de repente empobrecer e perder privilégios (...)?"

Pois o caso, precisamente, é que o estatuto social não só não depende do vencimento e dos privilégios, como inclusive é suposto compensar as limitações de ambos.

O que esse estatuto não dispensa, como V"PV" aliás nota linhas abaixo, é uma "ética própria" que, precisamente, deve assegurar a prevalência do espírito de serviço público e contribuir para imunizar esses (e outros) sectores do funcionalismo público contra comportamentos egoistas que minam o prestígio das corporações em que se integram.

É por isso que, no próprio interesse da preservação do seu estatuto social, nem os juízes, nem os militares, nem os polícias devem sucumbir à tentação de se comportarem como meros assalariados.

PS - Note-se como, no artigo de hoje, V"PV" grafa "Europa" entre aspas, mas destaca autoridade com itálico. Sabe-a toda, o velho matreiro.


Menez.

17.9.05

Impasse?

Há anos que ouço dizer que Carmona Rodrigues é uma pessoa séria e um técnico competente. Será. Mas a verdade é que, enquanto político, limitou-se a servir de capacho a Santana, uma função que, obviamente, não o dignificou. Nada o recomenda para Presidente da Câmara de Lisboa.

E Carrilho? Mesmo deixando de lado a forma das suas intervenções públicas, que bastaria para desqualificá-lo, é preciso reconhecer que a sua pré-campanha se saldou por um completo fiasco. O seu discurso parece colado com cuspo, revelando uma surpreendente incapacidade de assimilar e articular algumas boas ideias que os assessores lhe terão assoprado. Para tornar as coisas ainda piores, dispara insensatas propostas demagógicas em todas as direcções.

O voto raramente nos permite apoiar aquela que seria, do nosso ponto de vista, a solução ideal. Resta-nos escolher um bem relativo ou, ainda mais frequentemente, um mal menor.

Nas presentes circunstâncias, o mal maior parece-me ser dar o poder a um dos candidatos suportados pelos dois principais partidos, vindicando com essa benevolência a arrogância e o desprezo pelos eleitores com que no-los impuseram.

A abstenção parece-me também uma má alternativa, porque não castigará o autismo do PS e do PSD como ele merece ser castigado.

Não me identifico com nenhuma das forças políticas que suportam os restantes três candidatos. Tampouco me sinto arrebatado pelas suas personalidades individuais. Ainda assim, acredito que qualquer um deles dará um Presidente da Câmara mais aceitável do que Carmona ou Carrilho.

Por conseguinte, se o eleitorado lisboeta não quiser fazer completa figura de parvo, tem uma saída óbvia. Quem sabe se a humilhação do PS e do PSD na capital não poderá até ser o princípio de uma viragem na governação dos partidos políticos portugueses?

O que é que temos a perder?

16.9.05

Eleições proveta

Ora aqui está uma coisa que me pôs a pensar: a possibilidade de as próximas eleições presidenciais serem encaradas como uma experiência crucial que poderá (ou não) falsear uma ousada hipótese científica. Sendo assim, a coisa promete tornar-se interessante.

Hoje há jackpot

Lembram-se de alguma vez o indomável, o temível, o hiper-crítico Vasco "Pulido Valente" não ter estado do lado dos vencedores nos últimos trinta anos?

Vá lá, ganhem juízo e apostem tudo no Cavaco!

15.9.05

Simpatia pelos velhos mafarricos



Os Rolling Stones eram seis, não cinco. O sexto elemento, Ian Stewart, participou em todas as gravações e tournées do grupo até 1970. Mas tinha uma aparência demasiado normal para poder ser apresentado como um dos Stones.

Efectivamente, o sucesso do grupo exigia que os jovens fãs acreditassem que o comportamento dos músicos na sua vida privada correspondia rigorosamente à sediciosa imagem que exibiam em público.

O que escandalizava os adultos tanto quanto deslumbrava os adolescentes era precisamente a recusa dos bons costumes e das boas maneiras, a descarada assumpção do mau gosto, a transgressão dos tabús mais sagrados, o desafio ao estado de coisas dominante, a sensualidade sem peias - tudo coisas próprias de um grupo que abraçara sem vergonha o rythm n´blues, música demoníaca de negros americanos marginais e debochados.

Quando os Beatles foram acusados de posse de droga, tudo fizeram para provar a sua inocência, que, sabe-se hoje, era real. Quando o mesmo aconteceu com os Stones, o tema foi orgulhosamente exibido no LP seguinte e transformado, com toda a naturalidade, em mais um hit.

Esta intenção deliberada de provocar a rejeição da sociedade respeitável foi assumida da forma mais extrema pelo sinistro e repelente Keith Richards, uma espécie de moderno Heathcliff repescado de "O Monte dos Vendavais", o género de patife que todos desejamos ver o mais longe possível das nossas filhas.

Com o passar do tempo, é claro, o rastilho apagou-se, e os Stones acabaram por simbolizar um anémico satanismo middle-class que nos deixa indiferentes. Tirando o professor Espada, já não incomodam ninguém.

Como dizia Mick Jagger, num tempo já longínquo: "não se deve confiar em ninguém com mais de 40 anos". Por muito que nos custe, a mim e a eles, Deus falou pela boca do Jagger criança.

Em 2005, com A Bigger Bang, eles continuam a fazer o que sempre fizeram, e, o que é mais, a fazê-lo bem. Nem outra coisa se poderia pedir-lhes.

Quanto àqueles que não apreciam a música, devem ao menos reconhecer que, ao recusarem-se a passar à reforma, os Stones dão a sua contribuição para evitar que a segurança social vá à falência.


Edvard Munch: Sonho de uma noite de Verão: a Voz, 1893.

14.9.05

O sistema Adriaanse

O sistema Adriaanse já está mais ou menos visto: consiste apenas e só em mandar toda a gente para a frente e em dizer-lhes para rematarem muito à baliza.

O resultado é que o FC Porto está a ficar parecido com o Sporting da época passada. Faz um jogo bonito, deslumbra os adeptos, recolhe os aplausos da crítica - mas, no fim, perde.

"Ah, e tal, tiveram azar", diz-se. O segundo golo do Rangers foi faltoso, o Prso deveria ter sido expulso, o FC Porto falhou golos fáceis e, ainda, por cima, teve que jogar quase um quarto de hora com um jogador a menos.

Pois é, se o FC Porto tivesse um marcador de categoria, teria ganho 5-3, em vez de perder 2-3. Alternativamente, se tivesse uma defesa decente, ganharia por 2-0, em vez de perder 2-3. O facto é que, efectivamente, não tendo nem uma coisa nem outra, não pode jogar como se tivesse.

Os três jogos anteriores para a Liga nacional não foram assim tão diferentes do de ontem. O FC Porto sofreu dois golos contra o Naval, e percebe-se que tem competência para encaixar sempre uns quantos perante qualquer adversário medianamente atrevido.

Por outro lado, precisa de pelo menos vinte remates para fazer um só golo. Isto é assim porque o treinador lhes manda rematar sempre que puderem, em vez de lhes recomendar que trabalhem os lances primeiro.

Este FC Porto é uma equipa estouvada. Joga com entusiasmo, mas sem cabeça. Como está recheada de bons jogadores, dá frequentemente espectáculo. Como é desequilibrada e o treinador se recusa a ter isso em conta, dificilmente conseguirá estar à altura das expectativas.

13.9.05

All the president's friends

Paul Kugman prossegue a demolição da Administração Bush, perguntando-se até que ponto terá já chegado o sistemático desmantelamento de departamentos do Estado americano anteriormente reputados pela sua competência a lidar com situações difíceis.

Curiosamente, nenhum jornal português acha relevante traduzir os artigos de Krugman, um dos mais lúcidos comentadores da política e da economia americana da actualidade.

Adenda

Na descrição que hoje fiz dos gatunos elegantes, esqueci-me de acrescentar que alguns deles participam frequentemente em debates televisivos.

O que nulidade quer dizer

O Público perguntou a Marques Mendes como se diferencia ele politicamente de José Sócrates. Eis a resposta:

"Há duas diferenças essenciais. Uma no plano do modelo de desenvolvimento económico: não sei qual é o dele, mas sei que o meu não é o do betão. Outra no plano da governabilidade, pois entendo que seria positivo que os dois principais partidos fizessem entendimentos alargados a várias legislaturas que dessem garantias de estabilidade e perenidade a políticas estruturantes essenciais. São duas diferenças que não são de somenos."

No comments.

Quem seria?

Vi hoje um cartaz de um candidato às autárquicas que me ficou na retina.

O texto, altamente alarmante, prometia táxis sociais gratuitos para os idosos.

Mas o que mais me chamou a atenção foi a foto do candidato, assim um tipo com ar de lobo mau a sorrir para o capuchinho vermelho.

Coisa estranha, porém: não me lembro quem era ele. Esta maldita memória prega-me às vezes cada partida!

Um País de Eventos?

Imagino que algumas pessoas vão ficar surpreendidas, mas eu encontro méritos nesta opinião do Medeiros Ferreira.

O Mourinho tem as costas largas

O único defeito que vejo neste tipo é que escreve relativamente pouco.

Vá lá, mais um esforço.


Saura: D. Quixote e Sancho Pança.

Corrupção: a autárquica e a outra

Há uma irritação generalizada no país contra a corrupção autárquica com laivos de paranóia irracional.

A verdade é esta: quando falamos de corrupção autárquica estamos a falar de tremoços em comparação com a corrupção do Estado central, pela simples razão de que este último movimenta mais de 90% das verbas dispendidas pela administração pública. Ora os ladrões costumam concentrar os seus esforços onde está o dinheiro, não onde ele escasseia.

O que às gentes bem pensantes mais incomoda nos autarcas é o perfil burgesso, o bigode à Saddam, a peúga branca, os tiques do novo rico que, como se sabe, caem sempre muito mal, principalmente entre quem deseja esquecer rapidamente as suas origens. O ódio de classe manifesta-se hoje nestes pequenos detalhes.

Mas, se olharmos para as coisas com distância, que é como devem ser vistas quando se quer entender e agir com eficácia, as autarquias são meros subúrbios do Estado Central, esse sim, pejado de gabirús perfumados que vestem Emiliano Zegna e frequentam as festas organizadas pelas melhores famílias. Gatuno elegante é outra coisa!

No debate de ontem no Pró e Contras, alguém - olha, o Montalvo! - lembrou da plateia isto mesmo, fazendo ver que a pequena e média corrupção de pé rapado é, ao fim e ao cabo, um epifenómeno de uma máquina estatal tão centralizada que, para alguém vender gelados na praia, precisa de obter uma licença do Ministério da Defesa. Silêncio sepulcral entre os participantes do debate.

Quem estiver disposto a pensar, cedo entenderá que, sem regionalização administrativa, estes e outros problemas nunca terão solução. A regionalização é a reforma da administração pública de que de facto o país precisa. Sem ela, continuaremos a ter um Estado caro, ineficiente e corrupto.

Há nove anos atrás o país parou no tempo porque as trampolinices do Professor Marcello tiveram sucesso e, no espaço de meses, a interrupção voluntária da gravidez e a regionalização democraticamente controlada do país foram rejeitadas.

Agora, queixam-se de quê?

12.9.05



Edvard Munch: Criança doente, 1907.

11.9.05

Desmancha-prazeres


Aqui para nós: se eu fosse sportinguista, teria ficado muito preocupado com o que se viu ontem à noite em Alvalade.

Acabar um jogo em casa contra o penúltimo classificado (ainda por cima reduzido a dez jogadores) com o credo na boca não me parece muito promissor...

A polícia ausente

Um dirigente do Sporting, cujo nome não retive, criticou a PSP por, ao contrário do que é costume, não ter enquadrado devidamente a claque do Benfica na sua caminhada para o Estádio do Sporting, o que teria contribuído para a ocorrência dos graves confrontos de ontem entre adeptos dos dois clubes relatados pela televisão.

A Comissária da PSP Anabela Alferes desmentiu o porta-voz do Sporting, afirmando que os adeptos do Benfica foram, como habitualmente, enquadrados pela polícia ao longo de todo o percurso, até à entrada do estádio.

Como as cenas de pancadaria se passaram praticamente debaixo da minha janela, posso testemunhar que ou a comissária Anabela Alferes foi mal informada, ou faltou à verdade. Esta foi a primeira vez, desde há muitos anos, que a PSP deixou a claque do Benfica avançar sem qualquer controlo visível sobre Alvalade, sendo que muitos dos participantes da marcha traziam nas suas mãos pedras e garrafas de cerveja. Quando eles se cruzaram com adeptos do Sporting que saíam da estação de Metro de Telheiras, as agressões começaram imediatamente.

Os polícias presente no local eram poucos e aqueles que rapidamente acorreram da esquadra vizinha estavam mal equipados. A actuação da polícia foi, como é hábito, desorganizada e improvisada, sendo manifesta a ausência de um plano de acção para reagir a circunstâncias similares.

Muito rapidamente, alguns agentes começaram a disparar (balas de borracha, ao que ouvi na televisão), assustando mais os pacíficos transeuntes do que os embriagados energúmenos que estavam ali para isso mesmo.

Um agente da PSP foi ferido na cabeça por uma pedrada. Fico a pensar como é possível mandar-se alguém para uma situação daquelas sem, pelo menos, um capacete. De passagem, notei como os estúpidos lancis de pedra que, desde o 2004, separam as faixas de rodagem, dificultam a movimentação das ambulâncias - tal como dificultarão a dos carros de bombeiros no dia em que forem necessários.

Qualquer pessoa que tenha assistido ao jogo pela televisão sabe que, apesar de, oficialmente, a polícia ter procedido a revistas à entrada do estádio, ocorreram múltiplas detonações durante o jogo.

Há poucas semanas escrevi aqui um post sobre a curiosa inacção da polícia face a pequenas e grandes alterações da ordem pública que afectam o nosso quotidiano. Os acontecimentos de ontem recordaram-me a mim - e, comigo, a muitos habitantes de Telheiras - que, para muitos efeitos práticos, é como se a PSP não existisse.

Acho que o Comando-Geral da PSP e o Ministro da Administração Interna (se o primeiro falhar), deveriam investigar a estranha abulia da polícia no dia de ontem e, em particular, as razões da alteração dos procedimentos utilizados nos últimos anos para controlar a claque do Benfica. O que é que isto significa?

Os telespectadores do jogo de ontem puderam todos ver um indivíduo a lançar um petardo para dentro do terreno. Acaso foi detido? Não ouvi nada sobre isso. Se o não foi, porque não pede a PSP através da tv ajuda para a sua identificação? Naturalmente, porque deu o assunto por arquivado.

Agora, vamos ao mais importante. Há coisa de uns vinte anos, ocorreram uma série de incidentes graves com hooligans em Inglaterra e noutros países, alguns dos quais provocaram mortes e ferimentos sérios. O Governo mobilizou-se, a polícia organizou-se, e o problema foi, no essencial, resolvido.

De que é que se está à espera para meter na ordem os bandos de delinquentes que se mascaram de claques de apoio? Naturalmente, este não é um problema exclusivamente policial, mas político.

Se os clubes patrocinam e financiam as claques, os seus dirigentes devem ser legalmente responsabilizados pelos desmandos que elas praticam. Se os jornais desportivos e os canais de televisão transmitem apelos à violência, devem também sofrer as consequências dos seus actos.

É assim tão difícil fazer-se qualquer coisa?

(Redigido este post, descobri estoutro sobre o mesmo assunto, que subscrevo por inteiro.)

Todos à loja das fardas!

Então é assim. Por um lado, a lei veda aos militares o direito de organizarem manifestações de carácter sindical, mas não o de participarem em manifestações organizadas por outros, desde que não compareçam fardados.

Por outro lado, Francisco Louçã declarou-se indignado com a proibição da manifestação decretada pelo Governador Civil de Lisboa.

Que fazer?

A meu ver, a coisa resolve-se assim: Como os militares não podem organizar eles próprios uma manifestação sem violarem a lei, sugiro que a convocatória fique a cargo do Bloco de Esquerda.

Desse modo, os militares já podem gritar a sua indignação pela perda dos direitos adquiridos. No entanto, continuam a não poder ir fardados. Para tornear este pequeno problema também tenho uma solução: Francisco Louçã, Luís Fazenda, Ana Drago e os outros líderes do Bloco vão a uma loja de fantasias alugar fardas e aparecem eles na manifestação mascarados de militares - de preferência de alta patente, para fazer mais efeito na televisão.

Que acham? Não vos parece mesmo uma ideia criativa digna do Bloco de Esquerda?

9.9.05



Edvard Munch: Cinzas, 1894.

A sondagem

A sondagem da Universidade Católica hoje divulgada n' O Público revela em primeiro lugar, sem margem para dúvidas, que a maioria dos portugueses acredita que as próximas eleições presidenciais serão muito importantes para o futuro do país, que o Presidente deveria ter mais poderes, e que, mais importante ainda, deveria intervir no dia a dia da governação.

Concordo com a resposta deles à segunda pergunta, discordo quanto à terceira, e ainda não estou certo se a eleição presidencial será de facto importante.

Passando às preferências reveladas pelos diversos candidatos, vê-se que, redistribuindo os indecisos, Cavaco deverá recolher 49% de votos na primeira volta.

Este método da redistribuição é inteiramente legítimo, dado que, numa eleição, só contam os votos efectivos expressos. Duvido, porém, que ele seja muito fiável neste momento, dado que, somando os que se propõem votar noutros candidatos não propostos, as intenções de votar branco ou nulo, os eleitores que declaram não tencionar votar e ainda os que não sabem o que farão ou se recusam a responder, temos que 48% das pessoas entrevistadas, ou seja, quase metade, não optaram ainda por nenhum candidato.

É essa, aliás, a posição em que eu próprio me encontro.

Moral da história: ainda é cedo para os partidários de Cavaco tirarem o champanhe do congelador.

Sinais

A publicitação das pensões de reforma auferidas por Cavaco Silva parece um sinal evidente de que ele estará em definitivo decidido a candidatar-se.

O anti-americanismo ataca onde menos se espera

Pois é verdade: já não se pode confiar em ninguém.

O que isto prova é que, ao fim de uns anos de interregno, voltámos a ter a direita mais estúpida do mundo. É a crise, é a crise...






Kaija Saariaho: Cinzas.

(Com os meus agradecimentos ao Augusto Seabra pela recomendação.)

8.9.05

Descobertas

Contrariando algumas vozes pessimistas, acabo de encontrar mais dois novos blogues que valem bem uma visita: Câmara Corporativa e Menina Não Entra.

O grau zero da argumentação

Começa a ser cómica a insistência com que alguns se refugiam na denúncia do anti-americanismo como artifício para recusarem toda e qualquer avaliação crítica da política externa ou interna dos EUA. O artigo de Pacheco Pereira n' O Público de hoje é um perfeito exemplo deste facciosismo cego.

No fundo, eu percebo-os: se há caso em que os factos falam por si, pondo a nu as debilidades da argumentação da nova direita revolucionária, doutrinária e iluminada, este das consequências do furacão Katrina é precisamente um deles.

Basta ver e ouvir para perceber.

Por isso, não contem comigo para participar nesse debate viciado à partida. Eu sei que o anti-americanismo existe, e já me pronunciei mais do que uma vez sobre os seus malefícios passados e presentes, mas, definitivamente, neste momento, não é essa a questão.

7.9.05

Aviso

Proponho que as fardas dos militares passem a ostentar, em local bem visível, uma etiqueta com os dizeres:

Cuidado: a guerra pode ser prejudicial para a sua saúde.

Talvez não tenha grande efeito prático, mas, pelo menos, o Mundo fica um bocadinho mais coerente.

6.9.05



Edvard Munch: A dança da vida, 1899-1900.

5.9.05

A can't do government

Extracto do artigo de Paul Krugman no The New York Times, que copiei do Blogue de Esquerda:

Before 9/11 the Federal Emergency Management Agency listed the three most likely catastrophic disasters facing America: a terrorist attack on New York, a major earthquake in San Francisco and a hurricane strike on New Orleans. "The New Orleans hurricane scenario," The Houston Chronicle wrote in December 2001, "may be the deadliest of all." It described a potential catastrophe very much like the one now happening.

So why were New Orleans and the nation so unprepared? After 9/11, hard questions were deferred in the name of national unity, then buried under a thick coat of whitewash. This time, we need accountability.

First question: Why have aid and security taken so long to arrive? Katrina hit five days ago - and it was already clear by last Friday that Katrina could do immense damage along the Gulf Coast. Yet the response you'd expect from an advanced country never happened. Thousands of Americans are dead or dying, not because they refused to evacuate, but because they were too poor or too sick to get out without help - and help wasn't provided. Many have yet to receive any help at all.

(...)

Maybe administration officials believed that the local National Guard could keep order and deliver relief. But many members of the National Guard and much of its equipment - including high-water vehicles - are in Iraq. "The National Guard needs that equipment back home to support the homeland security mission," a Louisiana Guard officer told reporters several weeks ago.

Second question: Why wasn't more preventive action taken? After 2003 the Army Corps of Engineers sharply slowed its flood-control work, including work on sinking levees. "The corps," an Editor and Publisher article says, citing a series of articles in The Times-Picayune in New Orleans, "never tried to hide the fact that the spending pressures of the war in Iraq, as well as homeland security - coming at the same time as federal tax cuts - was the reason for the strain."

In 2002 the corps' chief resigned, reportedly under threat of being fired, after he criticized the administration's proposed cuts in the corps' budget, including flood-control spending.

Third question: Did the Bush administration destroy FEMA's effectiveness? The administration has, by all accounts, treated the emergency management agency like an unwanted stepchild, leading to a mass exodus of experienced professionals.

(...)

I don't think this is a simple tale of incompetence. The reason the military wasn't rushed in to help along the Gulf Coast is, I believe, the same reason nothing was done to stop looting after the fall of Baghdad. Flood control was neglected for the same reason our troops in Iraq didn't get adequate armor.

At a fundamental level, I'd argue, our current leaders just aren't serious about some of the essential functions of government. They like waging war, but they don't like providing security, rescuing those in need or spending on preventive measures. And they never, ever ask for shared sacrifice.

Yesterday Mr. Bush made an utterly fantastic claim: that nobody expected the breach of the levees. In fact, there had been repeated warnings about exactly that risk.

(...)


Edvard Munch: À tardinha em Karl Johan, 1892.

4.9.05

A América tal como ela é

Aqueles que dos EUA conhecem um bocadinho mais do que Manhattan já sabiam há muito que aquilo a que impropriamente chamamos Terceiro Mundo é parte integrante da paisagem americana.

A profundidade e extensão da miséria que presenciei em Filadélfia e Baltimore, por exemplo, já não existe de todo nos países europeus mais desenvolvidos - nem sequer, aliás, em Portugal.

A América não gosta dos pobres - nem dos deles nem dos dos outros - porque presume que eles têm o que merecem: se são pobres, alguma coisa terão feito (ou deixado de fazer) que o justifica. Para o fundamentalismo evangelista, a pobreza é filha do pecado.

Outra coisa que deveria ser sabida, mesmo dos que apenas estiveram em Nova Iorque, é a má qualidade genérica das infra-estruturas e dos equipamentos públicos, fruto do desleixo a que foram votados na gloriosa era das presidências Reagan e Bush pai.

Valha a verdade que, desde então, houve uma notória inversão de atitudes, e que George W. Bush deu, nesse aspecto, continuidade às politicas de Clinton, a tal ponto que o crivo a que são actualmente submetidos os investimentos públicos federais é, genericamente, muito menos apertado do que na Europa.

Ainda assim, o facto é que os diques que protegiam a cidade de Nova Orleães ruíram, e que o líder dos Republicanos na Câmara dos Representantes sustentou que a reconstrução da cidade não é uma responsabilidade do Governo federal.

3.9.05

Cavaco esbanjador

Ainda a propósito do tão propalado rigor financeiro de Cavaco Silva, aqui justamente questionado, eu gostaria de perguntar que análises custo-benefício mandou ele fazer para justificar grandiosas obras como a 2ª ponte sobre o Tejo, a ponte do Freixo, o Centro Cultural de Belém, a passagem para peões de Alcântara, a gare do Oriente, a linha de Metro para a Expo ou a Via do Infante, para mencionar apenas alguns exemplos. E, já agora, recordo também que Ferreira de Amaral, Ministro dos Transportes e Obras Públicas dos governos de Cavaco, se gabava de que não perdia tempo com estudos, porque o importante era fazer obra.

É preciso que isto se diga no momento em que, relativamente à OTA e ao TGV, os comentadores da área do PSD, com Pacheco pereira à cabeça, se mostram tão entusiasmados com as virtudes do planeamento rigoroso de que no passado tanto escarneceram.

2.9.05

Hoje acordei assim



Edvard Munch: Morte de Marat, 1907.

1.9.05

Acerca da sobrevivência do Ciberdúvidas

Tem toda a razão de ser, a pergunta do Pacheco Pereira sobre como deveria ser assegurada a sobrevivência do Ciberdúvidas.

Visto que durante algum tempo acompanhei o assunto de perto, posso dar o meu testemunho pessoal sobre ele.

A manutenção de um site como o Ciberdúvidas envolve o trabalho gracioso de muita gente, desde logo o do núcleo de colaboradores responsáveis pelos seus conteúdos. Além disso, há também a parte técnica.

A dada altura, ajudei o João Carreira Bom a arranjar uma empresa que se prestou a assegurar o alojamento e a manutenção do site, e ainda a proceder a uma série de melhoramentos que o tempo tornara inadiáveis. Tudo grátis, evidentemente.

Ainda assim, sobrava o trabalho administrativo e de secretariado que o Ciberdúvidas implicava para poder assegurar uma resposta rápida a quem colocava as suas dúvidas. E, aí, não havia outra solução senão pagar de facto a quem se encarregasse dessas tarefas.

Embora, a dado momento, se tivesse falado na possibilidade de a Secretaria de Estado da cultura dar uma ajuda ao Ciberdúvidas, é um facto que essa nunca foi a solução preferida do João. Assim, ofereci-me mais uma vez para ajudá-lo a tentar arranjar patrocínios de empresas para as quais uma iniciativa desse género poderia fazer sentido.

Durante anos batemos a várias portas e falámos com muita gente. Sempre sem resultado, apesar de o montante em causa ser relativamente insignificante. Se bem me recordo, vinte mil contos por ano seriam o bastante.

Mas a verdade é que grandes empresas portuguesas que, sem benefícios relevantes, gastam por ano centenas de milhares de contos a patrocinar futebol, nunca acharam que a valorização do bem falar e escrever português pudesse ser uma causa digna de apoio.

Só quando o João Carreira Bom faleceu, vai para quatro anos, tive conhecimento do muito dinheiro que ele teve que pagar do seu bolso para manter o Ciberdúvidas vivo.

Por conseguinte, à pergunta sobre se não poderia a sociedade civil suportar iniciativas deste género, a resposta é infelizmente esta: só se fosse outra sociedade. Não esta, nunca esta, orientada por uma classe dirigente inculta e ignorante que disfarça a sua própria boçalidade justificando-a com a alegação de que o povo só se interessa por bola.

É uma história triste, reconheço-o, mas foi assim.

O cartaz

Ele deu a cara pela cidade de Lisboa, e vejam o estado em que ela ficou.