26.4.07

A brecha

Quando proclamou a libertação da pátria empoleirado numa guarita, nesse já distante 25 de Abril de 1974, Francisco Sousa Tavares não anunciou um facto, mas um desejo.

Não é verdade que, no final desse dia, se tivessem tornado impensáveis, como julga Rui Tavares (v. artigo de ontem no Público), a polícia política, a censura e os presos de opinião.

As pessoas mais informadas não ignoravam que algo estava para acontecer. Sabiam inclusive que havia uma espécie de corrida contra o relógio de vários sectores das forças armadas com propósitos políticos bem diversos.

Quando, ao anoitecer de 25 de Abril, apareceu na televisão uma Junta de Salvação Nacional composta de sujeitos mal encarados e presidida por Spínola, ninguém ficou a saber exactamente ao que vinha o tal MFA (repare-se como é voluntariamente inócua a designação).

Passaram dias até se obter a promessa de extinção da PIDE, de legalização dos partidos políticos e de organização de eleições livres, para já não falar da admissão do princípio da auto-determinação das colónias. Acresce que, decorrido um mês, já havia de novo presos políticos, e não me refiro a responsáveis do regime deposto.

É falsa (e ademais perniciosa) essa fantasia de um dia perfeito que, como por magia, nos serviu a liberdade numa bandeja. Não foi assim, nem jamais poderia ter sido assim.

Em 25 de Abril de 1974 abriu-se uma brecha, e já não foi pouco. Seria preciso mais um ano e meio de luta política até ficar absolutamente claro que espécie de regime iria vigorar em Portugal.

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