18.12.09

O estranho caso do Banco Central Europeu

.


Quando, em 1942, Keynes começou a meditar no plano de reforma da ordem económica e financeira mundial no pós-guerra, uma das suas principais preocupações era prevenir e penalizar a ocorrência de sistemáticos excedentes comerciais nalguns países.

Na época, eram os EUA que se encontravam nessa situação; hoje, são a China, o Japão e a Alemanha, mas é claro que o problema chinês sobreleva todos os restantes.

Como se sabe, não triunfou o entendimento de Keynes, para quem o excesso de poupança devia talvez ser considerado o problema número um. De jeito que o FMI, a instituição central do sistema monetário internacional que emergiu após 1945, penaliza os devedores mas não os credores.

Esse preconceito contra a despesa e a favor da frugalidade não assenta em sãos princípios económicos, mas num bacoco moralismo de inspiração calvinista que, na altura, ia de encontro aos interesses dos EUA.

Sucede que, como a pouco e pouco se está a tornar claro, o BCE é uma espécie de FMI não só para os países da zona euro, como para todos os que integram a UE, e, ainda, para outros que a ela estão mais associados (ex: Islândia).

Ora, também no nosso FMI continental, prevalece a mesma despreocupação em relação ao comportamento daqueles governos cujas políticas mercantilistas alimentam em paralelo poupança interna excessiva e superávites externos colossais e crescentes, como é o caso da Alemanha.

Subsiste então na opinião pública e em muitos comentadores a pueril ficção de que é possível penalizar a Grécia sem ao mesmo tempo penalizar os bancos alemães, austríacos, ingleses e franceses que lhe emprestaram dinheiro.

Não é o caso. Se acaso a Grécia viesse a declarar a impossibilidade de pagar atempadamente o que deve, não tenhamos dúvidas de que, aí, a UE e o BCE interviriam.

Mas, então, o que faz sentido é intervirem imediatamente, caso contrário não só a crise grega poderá continuar a agravar-se, como crescerá a percepção de risco de outros países em dificuldades.

Os arranjos que subjazem ao espaço monetário europeu não fazem sentido. É altura de começar a pensar em reformá-los.
.

Sem comentários: