8.8.10

Como não discutir a política industrial

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O destaque na capa - "Leviathan Inc., The state goes back into business" - anuncia um desastre de proporções bíblicas. No interior, o título do dossiê dedicado ao ressurgimento da política industrial confessa logo ao que vêm: "Picking winners, saving loosers".

O artigo do Economist desta semana inicia-se com umas quantas anedotas sobre exemplos cómicos de políticas industriais disparatadas. Note-se que é igualmente fácil fazê-lo com grandiosas iniciativas empresariais privadas (exemplo: a tentativa falhada da Ford, nos anos 30, de convencer todos os americanos a comprarem um avião).

São pontualmente citadas algumas afirmações inócuas de Dani Rodrik, um dos mais destacados estudiosos e entusiastas das políticas industriais. Quem tiver pachorra para ler até ao fim a muito custo lá encontrará três sugestões para evitar os aspectos negativos das políticas industriais.

Mas a ideia-chave está explicitada no leader: "Picking industrial winners nearly always fails". Que quer isto dizer ao certo? Terá o Economist procedido primeiro à listagem exuastiva de todos os casos de políticas industriais e depois à de todos os fracasssos para poder afirmar que na esmagadora maioria das ocorrências a coisa falhou? Em caso positivo, importa-se de explicar como o fez?

Nada disto é intelectualmente honesto. Estas ideias feitas são permanentemente repetidas por pessoas que, na verdade, absolutamente nada entendem do assunto. O que sabemos sem margem para dúvidas é que nenhum país (insisto: nenhum, nem sequer a Grã-Bretanha ou os EUA) logrou industrializar-se sem uma consistente e determinada intervenção dos poderes públicos*.

A condenação urbi et orbe da intervenção estatal no desenvolvimento económico é tão insustentável como a da iniciativa privada. É claro que, em muitos casos, ela falhou, mas em muitos mais falharam também as empresas privadas. Logo, isso nada prova. O fracasso é corrente e normal em economia, sobretudo quando as iniciativas se multiplicam e a economia cresce rapidamente.

Uma discussão séria sobre o problema parte do entendimento das razões que determinaram os sucessos e fracassos passados da política industrial. Perceberemos então que o falhou não foi a intervenção do Estado, mas certas e determinadas concepções sobre o modo como essa intervenção deve ser conduzida.

* O papel insubstituível da política industrial no desenvolvimento económico é explicado de modo convincente pelo economista sul-coreano  Ha-Joon Chang em Kicking Away the Ladder ou, a um nível mais acessível, em Bad Samaritans.
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